Opinião

Derrota acachapante

O ESTADO DE S.PAULO
A presidente Dilma Rousseff levou uma derrota acachapante na eleição do presidente da Câmara dos Deputados. Mas há algo de positivo a comemorar na eleição do peemedebista Eduardo Cunha? Até onde a vista alcança é possível prever maior equilíbrio entre os Poderes Executivo e Legislativo, com a autonomia deste minimamente preservada. Isso é bom para a consolidação das instituições democráticas. Mas é preciso levar em conta que esse episódio não altera, ao contrário, ratifica, a natureza do presidencialismo de coalizão fisiológica consagrado pelo lulopetismo. A diferença é que essa coalização pode custar mais caro para o Executivo, prejuízo que também poderá ser maior para o País. Desse ponto de vista, portanto, nada a comemorar.

Por outro lado, ao meter os pés pelas mãos na tentativa truculenta de impor aos parlamentares da "base aliada" o seu candidato à presidência da Casa - o petista Arlindo Chinaglia -, Dilma deu mais uma demonstração de incompetência política, de sua incapacidade de enfrentar situações adversas com um mínimo de habilidade para, na pior das hipóteses, preservar a imagem e a liturgia do cargo que ocupa.

A incompetência da articulação política do governo foi tal que o PT acabou perdendo até o que não precisava perder. Ficou sem os três cargos na Mesa a que teria direito pelo acordo de lideranças, bem como o comando de comissões permanentes importantes, como a de Constituição e Justiça, porque ofereceu esses cargos a aliados numa tentativa desesperada, e afinal inútil, de dissuadi-los de apoiar o desafeto da presidente. E acabou tendo de amargar a traição de pelo menos meia centena de deputados com os quais contava.

Esse circo de horrores aconteceu porque Dilma Rousseff não aprendeu a mais elementar lição de seu astuto mestre: quando o perigo ronda, finja-se de morto. Que esperar dela, então, diante do desafio muito maior de reconduzir o País à trilha do crescimento, reajuste fiscal, controle eficaz da inflação, incremento qualificado do índice de emprego, recuperação da indústria, tudo isso convergindo para a consolidação e ampliação das conquistas sociais - tarefa eminentemente política impossível de ser cumprida sem uma liderança competente? Afinal, foi para isso que os brasileiros elegeram um presidente da República.

A chefe do governo se torna ainda mais vulnerável politicamente quando seus áulicos tentam argumentar que seu empenho em derrotar Eduardo Cunha deveu-se ao fato de se tratar de um parlamentar pelo qual Dilma Rousseff nutre enorme ojeriza, por considerá-lo fisiológico. Ora, como o Palácio do Planalto comprovou repetidas vezes - inclusive ao adiar para depois da eleição das Mesas do Senado e da Câmara a nomeação para os cargos de segundo e terceiro escalões da nova equipe de governo -, a prática do toma lá dá cá é generalizada na república petista. Qual então a autoridade moral dos petistas para acusar um desafeto de fazer exatamente aquilo que Lula ensinou que deve ser feito para garantir a "governabilidade" e que Dilma vem repetindo fielmente?

A partir de agora Dilma Rousseff terá de se haver com um presidente da Câmara dos Deputados que, se é suficientemente hábil para não ostentar hostilidade ao Palácio do Planalto - até porque pertence ao partido que continua sendo o maior aliado do governo, o PMDB do vice-presidente Michel Temer -, com toda certeza não deixará de marcar posição de independência em relação ao Executivo. Eduardo Cunha, já em seu rápido pronunciamento ao assumir o cargo para o qual foi eleito, garantiu que, cumpridas as preliminares legais, imediatamente colocará na pauta de votação da Câmara um projeto de lei em relação ao qual a Presidência da República já manifestou clara objeção: o do chamado orçamento impositivo, que impõe ao Executivo prazo para o pagamento de emendas parlamentares à peça orçamentária.

Há ainda muitas outras matérias relevantes de interesse do governo sobre as quais Eduardo Cunha poderá exercer seu poder de presidente da Câmara dos Deputados. E ele passa a ser a segunda pessoa na linha de sucessão da Presidência da República. Só resta esperar que disso tudo não saia perdendo o Brasil.

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