Opinião

A buzina do Fed

O Estado de S.Paulo
O aviso foi dado, há tempo para agir e quem tiver juízo tratará de se preparar, mas para isso o governo brasileiro precisará mudar seus hábitos e cuidar mais seriamente da política econômica. O banco central mais importante do mundo, o Federal Reserve (Fed), dos Estados Unidos, poderá elevar os juros antes do previsto, talvez já no primeiro semestre do próximo ano. O acesso ao financiamento internacional ficou mais difícil desde o ano passado e deve tornar-se ainda mais complicado com a mudança anunciada na política americana. A novidade foi apresentada pela nova chefe da instituição, a economista Janet Yellen, em entrevista depois da última reunião do Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc), órgão formulador da política monetária. Antes dessa entrevista, a previsão mais comum era de uma elevação da taxa no segundo semestre de 2015, provavelmente perto do fim do ano.

Essa foi a única surpresa depois da reunião regular do comitê. Como se previa, foi decidida uma nova redução do estímulo monetário à recuperação da economia americana. A partir de abril as compras de títulos para injetar dinheiro no mercado passarão de US$ 65 bilhões para US$ 55 bilhões. Será mantido, portanto, o corte de US$ 10 bilhões, adotado a partir da primeira redução, em janeiro. Com esse padrão, as compras estarão encerradas em outubro. Ainda haverá muito dinheiro no mercado e os juros básicos permanecerão muito baixos, na faixa de zero a 0,25% ao ano, mas a corrente de recursos adicionais terá sido cortada.

O passo seguinte, a elevação de juros, dependeria, segundo critérios anunciados em 2012, da redução do desemprego e do aumento da inflação. Os sinais seriam um desemprego de 6,5% e uma inflação prevista de 2,5% num prazo de dois anos. Não haveria gatilho, mas a conjunção dos dois sinais seria muito importante. Segundo a presidente Janet Yellen, o comitê deverá analisar também outros indicadores, incluídos a evolução dos salários e o crescimento sustentável da produção. Feito o balanço das condições atuais e das perspectivas, a alta de juros, indicou a presidente do Fed, poderá começar uns seis meses depois de encerradas as compras de títulos do Tesouro e de papéis lastreados em hipotecas.

A expectativa de qualquer redução dos estímulos bastaria para tornar financiadores e investidores mais severos na avaliação de empresas e países em busca de dinheiro. As condições do mercado já se tornaram mais apertadas nos últimos nove ou dez meses, desde o primeiro anúncio da provável diminuição - ainda sem data para começar - dos estímulos monetários. Os fluxos de capitais mudaram de rumo, o Brasil foi afetado e o Banco Central (BC) teve de agir para atenuar a alta do dólar e prevenir os efeitos inflacionários da depreciação cambial.

Meses depois do primeiro anúncio, um relatório do Fed incluiu o Brasil entre os países mais vulneráveis a mudanças no mercado financeiro e especialmente a alterações nos negócios de câmbio. Autoridades brasileiras contestaram o estudo, economistas nacionais e estrangeiros entraram na discussão e nomes ilustres, como Paul Krugman, ganhador do Prêmio Nobel de Economia, puseram em dúvida a avaliação do Fed.

É inútil discutir se o Brasil é um dos mais vulneráveis ao impacto de mudanças no mercado. Pode até ser menos vulnerável do que muitos outros, mas é bom levar em conta a opinião de financiadores e investidores. A imagem da política econômica brasileira está longe de justificar qualquer ufanismo.

É tolice cuidar do assunto como se o País estivesse envolvido em um concurso de beleza. Mesmo fora da lista dos quatro ou cinco mais vulneráveis, o Brasil poderá ser seriamente afetado por uma piora do humor de investidores e financiadores. Isso provavelmente ocorrerá se a inflação permanecer elevada, o governo insistir em maquiar suas contas, em vez de cortar a gastança, as exportações continuarem fracas e o crescimento, afinal, se mantiver muito abaixo da média dos emergentes bem administrados. É difícil de entender como um país pode ter todos esses problemas sem ser vulnerável. A presidente, formada em economia, talvez possa explicar.

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