Opinião

Enquanto o mundo se move

O Estado de S.Paulo
Boas notícias podem criar tensão e ansiedade no estranho mundo da especulação financeira, e a recuperação da economia americana, a maior do mundo, fornece um exemplo notável dessa bizarrice. Todo mundo será beneficiado pelo fortalecimento da principal potência econômica, mas a melhora dos indicadores pode ser também o sinal para a mudança da política monetária dos Estados Unidos. O início dessa mudança poderá ser decidido na próxima reunião do Fed (o banco central americano), marcada para terça e quarta-feira. Se os indicadores de produção e de emprego forem considerados satisfatórios e sustentáveis, o Fed começará a reduzir a emissão de dinheiro - cerca de US$ 85 bilhões mensais aplicados na compra de títulos federais em circulação no mercado. Essa política tem sido executada para estimular o crédito e os negócios. Com a alteração, o dólar se tornará menos abundante e mais caro, mas o mercado já se antecipou, nos últimos meses, valorizando a moeda americana e encarecendo o crédito.

O PIB dos Estados Unidos cresceu no segundo trimestre em ritmo equivalente a 2,5% ao ano - um desempenho especialmente invejável nas atuais condições do mundo rico. Mas essas condições têm melhorado. Cinco anos depois da quebra do banco Lehman Brothers e do início da maior crise desde os anos 1930, os EUA lideram a reativação das economias desenvolvidas, enquanto a zona do euro sai lentamente da recessão. O cenário dos países desenvolvidos fica menos nebuloso, com sinais de reativação também da economia japonesa, enquanto os emergentes perdem impulso depois de um desempenho bastante satisfatório durante vários anos.

Ainda sobram importantes desequilíbrios, tanto externos quanto internos, para ser resolvidos na Europa, nos Estados Unidos, no Japão, na Índia e na China, segundo advertiu na sexta-feira o FMI. Muito trabalho e muita disciplina ainda serão necessários para a volta à normalidade.

Não é tempo para complacência, apesar de algumas boas notícias, concordaram os ministros de Finanças da zona do euro, reunidos na Lituânia, na sexta-feira. A crise da zona do euro acabou, chegou a dizer o ministro francês Pierre Moscovici, mas a maioria preferiu conter o entusiasmo. Ainda é preciso fazer muito para arrumar as contas públicas de vários países, incluídos alguns dos mais poderosos da união monetária, como a França e a Itália, e ninguém o nega, apesar do desemprego ainda elevado e da resistência política a medidas de austeridade.

Mas alguns avanços importantes têm ocorrido, como a aprovação pelo Parlamento Europeu, na quinta-feira, de um supervisor central para o sistema bancário da zona do euro. A função caberá ao Banco Central Europeu (BCE), mas ainda será preciso definir detalhes importantes da operação do sistema, como o processo de liquidação de instituições financeiras. O progresso no rumo da união bancária e da implantação de normas comuns de disciplina fiscal é vagaroso, mas a agenda vai sendo cumprida, apesar de enormes dificuldades políticas.

Enquanto o mundo se mexe e se ajusta, o governo brasileiro, com muita dificuldade para fixar e seguir uma estratégia de modernização e de crescimento, prepara-se para iniciar as licitações de um programa de logística anunciado há um ano e com execução ainda incerta.

O caso brasileiro tem características especiais. Na América do Sul, outros países dependentes da exportação de commodities foram também afetados pela desaceleração da China e pela baixa das cotações. Mas alguns continuam crescendo mais que o Brasil, como Chile e Peru, e as taxas de inflação permanecem, na maior parte das economias em desenvolvimento, mais baixas que a brasileira. No Brasil, o Banco Central ainda prevê inflação acima da meta de 4,5% no segundo trimestre de 2015. Tolerante à alta de preços e sem uma boa política de crescimento, o governo continua atribuindo os infortúnios nacionais a forças externas. Enquanto isso, o resto do mundo vai enfrentando seus problemas.

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