Opinião

Lobby às claras

O Estado de S.Paulo
O governo federal está preparando um projeto para regulamentar a atividade dos lobistas, isto é, os representantes de grupos de pressão. Não será uma tentativa nova. Existem nada menos que seis projetos de lei no Congresso. O mais antigo deles, de autoria do então senador Marco Maciel (DEM-PE), é de 1989 e já foi aprovado no Senado, mas dormita na Câmara.

O mais recente é um projeto do deputado Carlos Zarattini (PT-SP), que está para ser votado na Comissão de Constituição e Justiça desde 2008. Além de anunciar sua própria iniciativa, a Casa Civil da Presidência da República admitiu endossar o texto de Zarattini. Seja como for, ou por iniciativa do governo ou por meio de um dos tantos projetos parlamentares, a regulamentação do lobby no Brasil deverá acontecer, mais cedo ou mais tarde, simplesmente porque é coerente com a maturidade democrática do País.

A prática de lobby no Brasil é mais antiga que a própria República. Basta lembrar a força que Irineu Evangelista de Souza, o Barão de Mauá, fez para convencer o governo de d. Pedro II a elevar, em 1844, os impostos sobre produtos importados a fim de proteger a indústria nacional. No entanto, essa atividade não foi regulamentada no Brasil, e hoje sua menção sugere sempre corrupção. A imagem que se tem dos lobbies, e exemplos disso não faltam, é a de um crime - seja de advocacia administrativa, tráfico de influência ou suborno - sempre prejudicial à prática democrática. No entanto, na realidade, o lobby é instituição essencial das democracias: funciona como instrumento de persuasão ou de pressão, para que interesses legítimos se façam ouvir não só no Parlamento, mas também no Executivo e no Judiciário.

Nos Estados Unidos, o exercício do lobby é considerado direito constitucional, pois, de acordo com a Primeira Emenda, não pode haver nenhum impedimento legal ao direito dos cidadãos de "dirigir petições ao governo para a reparação de seus agravos". Mesmo assim, a atividade só foi regulamentada em 1946. Desde então, os lobistas, devidamente registrados em órgão público, têm de deixar claro quanto dinheiro gastaram em suas atividades. Nada disso é garantia de que a atividade será totalmente idônea, como prova o escândalo protagonizado pelo superlobista Jack Abramoff, preso por ter subornado diversos políticos e autoridades americanas entre 1994 e 2001. A partir do seu caso, a atividade dos lobistas vem sofrendo cada vez mais restrições nos Estados Unidos - a ponto de jogar vários deles na informalidade.

No Brasil, o projeto que a Casa Civil patrocina também prevê que os lobistas sejam cadastrados e que não possam atuar se tiverem exercido cargo público no semestre anterior ao cadastramento. A ideia central, portanto, é diferenciar aqueles que buscam defender interesses setoriais de forma legítima e aqueles que apelam ao malfeito.

Há quem sustente que a atual legislação brasileira já tem instrumentos legais para punir o tráfico de influência e que o desafio não é criar novas leis, mas fazer trabalhar de forma coordenada e eficiente os órgãos responsáveis pelo combate à corrupção. Para esses especialistas, a regulamentação do lobby pode ser vista até mesmo como uma espécie de "institucionalização" da propina. Trata-se de um exagero. Se assim fosse, a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), entidade de países desenvolvidos, não teria recomendado, há dois anos, que seus integrantes regulamentassem a prática.

Desse modo, regulamentar a atividade lobista, em vez de fingir que ela não existe, é do mais alto interesse da democracia brasileira. É óbvio que apenas isso não terá o condão de acabar com o tráfico de influência, porque nada impede que os lobistas corruptos, hoje atuando nas sombras, passem a agir sem constrangimentos, por força de um simples crachá. A atividade deverá ser rigorosamente fiscalizada, devendo os parlamentares e os lobistas prestarem contas de suas ações, deixando claro quais forças atuaram sobre suas decisões.

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