Opinião

A fonte de novos apagões

O Estado de S.Paulo
O Brasil parece condenado a sofrer com os apagões. Novas interrupções do fornecimento de energia para extensas regiões do País, como as que têm ocorrido com frequência desde setembro, podem ser uma das consequências práticas danosas da Medida Provisória (MP) n.º 579, que trata das concessões do setor elétrico e das tarifas de energia.

Pelo menos é o que se pode concluir das declarações do presidente do Operador Nacional do Sistema (ONS), Hermes Chipp, segundo o qual o País precisa "conviver com certo nível de risco" no fornecimento de energia por falhas no sistema. Para eliminar todos os problemas, reduzindo os riscos ao mínimo, segundo ele, seria necessário fazer investimentos em bloco, o que acabaria sendo repassado para a conta de luz. Como a tarifa não pode aumentar em razão da política instituída pela MP 579, os investimentos não serão feitos no volume e no ritmo correspondentes às necessidades do País.

Se essa política funcionar, o consumidor deverá pagar menos pela energia, mas não terá a garantia de fornecimento regular, uma vez que as concessionárias, descapitalizadas, não terão recursos para investir no sistema, que continuará sujeito às falhas que provocam os apagões.

Para a presidente Dilma Rousseff, no entanto, as causas dos apagões são outras. Na maioria das vezes, segundo ela, as interrupções decorrem de falhas humanas. De fato, a baixa credibilidade do sistema elétrico, que a MP 579 corrói ainda mais, resulta, entre outros fatores, do despreparo dos operadores para agir em casos de emergência.

Reportagem do Estado (24/12) mostrou que, no apagão de fevereiro de 2011, quando oito Estados do Nordeste ficaram sem luz por horas, operadores não sabiam o que fazer, desconheciam itens essenciais dos manuais de operações e, quando tentaram agir em algumas circunstâncias, encontraram portões trancados, aparelhos fora de operação, disjuntores fechados e orientações discrepantes.

Para o consumidor que fica sem energia, porém, pouco importa saber se a causa foi ou não falha humana. Ele quer um sistema que lhe garanta fornecimento regular de energia. Mas o que se vai constatando na prática é que, ao mudar a regulamentação do setor elétrico com a MP 579, o governo poderá tornar o sistema mais suscetível a apagões, pois as alterações afetaram não só os investimentos futuros, mas também os que estavam em curso.

Como noticiou o jornal Valor (19/12), a Alstom, fabricante de equipamentos para o setor elétrico, teve congelados R$ 160 milhões relativos à parte que lhe caberia no programa de modernização da Usina de São Simão, da Cemig. Outra reforma suspensa pela concessionária é a da Usina de Volta Grande, com investimentos previstos de R$ 321 milhões, dos quais R$ 248 milhões em equipamentos a serem fornecidos pela Voyth Hydro.

Os planos da Cemig previam investimentos de R$ 1,6 bilhão na reforma de usinas nos próximos 15 anos, incluindo a de Salto Grande. Todas essas usinas entraram em operação há décadas - São Simão em 1978, Volta Grande em 1974 e Salto Grande em 1955 - e seus equipamentos já se tornaram obsoletos. Por isso, precisam ser trocados para que as unidades ganhem eficiência e mais potência.

O Brasil necessita de investimentos em infraestrutura, como reconhece o próprio governo, razão pela qual não faz sentido interromper programas em execução em um setor-chave, como o de energia hidrelétrica. Mas, como outras concessionárias, a Cemig não se sente em condições de dar garantias aos fornecedores, pois seus dirigentes ignoram qual será o cenário depois de a MP 579 entrar em vigor. "Como não temos segurança de que os próximos investimentos serão reconhecidos, eles acabam suspensos", disse Wantuil Dionísio Teixeira, superintendente da Coordenação Executiva para Modernização de Usinas da Cemig.

O problema é de extrema gravidade e não pode ser resolvido da forma autoritária como o governo tem conduzido a questão da redução das tarifas. Este é um item importante para dar mais competitividade à indústria nacional, como pretende o governo, mas é absurdo falar em ganhos de produtividade sem energia suficiente para atender à demanda do País.

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