Opinião

Jornada de vexames

O Estado de S.Paulo
Foi um caso exemplar de junção da fome com a vontade de comer. Interesses objetivos de parcelas ponderáveis do Congresso deram anteontem aos políticos que supostamente formam a base parlamentar do governo o clássico leque de oportunidades por que ansiavam para mostrar à presidente Dilma Rousseff, em português claro, quem é que manda no pedaço. Não sobrou nada para o Planalto se consolar - e, de passagem, resgatar do ridículo completo o secretário-geral da Presidência, Gilberto Carvalho. Ele entrou para o rodapé da história com a memorável declaração "Está tudo ótimo", enquanto do outro lado da Praça dos Três Poderes a autoridade política de sua chefe estava para ser dizimada.

Pode-se começar por onde se queira a crônica da jornada de vexames para a presidente que não apenas não consegue sair da crise com os seus volúveis aliados, como parece nela soçobrar cada vez mais, por não ter a menor ideia de como administrar a sua relação com esses calejados políticos dos quais, queira ou não, depende. O baque mais fragoroso foi o adiamento da votação da Lei Geral da Copa na Câmara dos Deputados, que encabeça a agenda de prioridades de Dilma. O PMDB aderiu gostosamente à resistência da bancada ruralista a deliberar sobre a matéria e ela ficou para as calendas. O que liga uma coisa à outra é o destino do projeto do Código Florestal - em torno do qual tudo mais gira para os 230 parlamentares que representam o agronegócio na Casa de 513 membros.

Não fosse a mala sangre entre o governo e a bancada dita governista (noves fora o PT e companheiros de viagem), essa seria uma queda de braço normal no cotejo de forças do Legislativo com o Executivo. A presidente, temendo que os ruralistas reconstituam o substitutivo ao projeto do governo que haviam conseguido aprovar e que foi desfeito no Senado, quer empurrar a decisão final para depois da conferência ambiental Rio+20, a se realizar em junho. Do contrário, saindo os ruralistas vencedores, Dilma correria o risco de receber o Troféu Motosserra com que os verdes distinguem aqueles a quem querem desmoralizar. E os ruralistas, na deles, condicionam a votação da Lei da Copa à antecipação do exame do Código. Tivesse Dilma de verdade a maioria numérica na Casa, o texto que a Fifa cobra seria votado.

A presidente amargou ainda a aprovação, na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, onde o governo também é em tese majoritário, da proposta de emenda constitucional que transfere para o Congresso a prerrogativa do Executivo de demarcar terras indígenas e áreas de preservação ambiental. Dado que o projeto tem longa tramitação pela frente, a derrota de Dilma foi antes simbólica do que substantiva - mas equivaleu a uma descompostura pública. Somem-se a isso a convocação da ministra do Planejamento, Miriam Belchior, para depor na Comissão do Trabalho da Casa, e os convites para o ministro da Fazenda, Guido Mantega, e o presidente da Comissão de Ética Pública da Presidência, Sepúlveda Pertence, falarem à Comissão de Fiscalização e Controle sobre assuntos embaraçosos - respectivamente, os problemas na Casa da Moeda e no Banco do Brasil, e as "consultorias" do ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel.

Leia na íntegra Jornada de vexames
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