Opinião

O pessimismo da ONU

O Estado de S.Paulo
Será preciso criar 64 milhões de empregos em todo o mundo para voltar à situação de antes da crise, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), mas a economia global terá mais um ano muito ruim, com risco de um segundo mergulho na recessão. Estas avaliações dão o tom do novo relatório sobre economia mundial preparado pelo Departamento de Assuntos Econômicos e Sociais da ONU para divulgação em 17 de janeiro. Alguns dos tópicos mais importantes, antecipados na terça-feira, reforçam o pessimismo quanto às perspectivas da atividade e das condições do emprego nos próximos meses. A criação daqueles 64 milhões de empregos - uma hipótese altamente improvável - compensaria as demissões ocorridas a partir de 2007, quando estourou a bolha financeira, e permitiria a absorção da mão de obra recém-chegada ao mercado de trabalho. Mas a recuperação econômica nos Estados Unidos e na Europa, segundo os autores do estudo, só ganhará impulso, neste ano, se as políticas forem alteradas.

A maior parte dos economistas havia descartado há mais de um ano o risco de uma segunda recessão no mundo rico, mas essa possibilidade está de novo em discussão e foi citada recentemente em estudo da Organização Internacional do Trabalho (OIT), também vinculada às Nações Unidas. De acordo com a OIT, o retorno à situação pré-crise seria possível com a abertura de 80 milhões de postos, mas num prazo de dois anos. Os dois estudos coincidem quanto ao pessimismo: com as políticas econômicas em vigor na Europa e nos Estados Unidos, a atividade continuará deprimida, o desemprego permanecerá elevado e também os emergentes serão contaminados pelo agravamento da crise.

O produto bruto mundial crescerá 2,6% em 2012 e 3,2% em 2013, segundo as projeções do Departamento de Assuntos Econômicos e Sociais. O desemprego médio no mundo rico ficou em 8,3% em 2011 e deverá continuar bem acima do nível de antes da crise, 5,8%. Com muita gente desocupada e salários deprimidos nas economias mais desenvolvidas, as possibilidades de crescimento dos emergentes também serão afetadas, embora esses países tenham sido capazes de uma forte recuperação depois da crise de 2008-2009.

Segundo os economistas da ONU, a estagnação será prolongada, e com risco de uma segunda recessão, se todos os governos continuarem dando prioridade à austeridade fiscal, isto é, a medidas de aperto para a recuperação das contas públicas.

A insistência nessa política, segundo esse raciocínio, dificulta a correção dos desajustes fiscais, porque deprime a economia, destrói empregos e compromete a arrecadação de impostos. O enfraquecimento das contas públicas agrava a situação dos bancos credores, porque as suas carteiras de títulos acabam sendo desvalorizadas. Esses fatores elevam o nível de riscos financeiros e econômicos. Mesmo endividados, muitos países ainda dispõem, segundo os autores do estudo, de espaço para a adoção de estímulos fiscais à recuperação da economia.

Os economistas chamam a atenção também para dois outros problemas: a insuficiente cooperação internacional contra a crise e os impasses políticos nos Estados Unidos, onde o governo enfrenta forte oposição a medidas fiscais para o combate ao desemprego e a reativação da economia.

Diagnóstico e receitas apresentadas nesse estudo são semelhantes, em muitos pontos, a avaliações e recomendações de economistas e dirigentes do Fundo Monetário Internacional (FMI). Políticas de austeridade podem ser inevitáveis em alguns países, mas governos com espaço de manobra deveriam adiar as medidas mais severas, tem repetido a diretora-gerente do FMI, Christine Lagarde.

Economistas de grande reputação, como Paul Krugman e Joseph Stiglitz, também têm apontado os perigos de um aperto fiscal antes da hora, mas avaliações desse tipo têm sido rejeitadas pelo governo alemão e pela oposição americana. Diante desse quadro, resta ao governo brasileiro preparar-se para um ano difícil. Mais do que nunca, será importante cuidar da eficiência econômica do gasto público.

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