Capitalismo em crise

Entre Wall Street e a Idade da Pedra

Hélio Schwartsman na Folha.com
A pedidos, comento as manifestações da família do "Ocupe Wall Street" que estão se espalhando pelo mundo. Acredito que elas podem ser úteis, enquanto ajudarem governos esclarecidos a impor uma regulação mais sábia sobre os mercados financeiros. Não é preciso ter pós-graduação em economia pelo Instituto Lênin para reconhecer que, em determinados setores, o Estado precisa criar mecanismos que moderem os apetites de agentes privados, sob pena de produzir megaconfusões como a crise de 2008, cujas consequências o planeta amarga até hoje.

Outro ponto interessante é que esse tipo de movimento, à medida em que lança legiões de jovens numa reflexão sobre o papel das instituições, contribui para arejar e até mesmo desfossilizar a ação política. É em ocasiões como essas que demandas das próximas gerações são incorporadas ao "Zeitgeist", o horizonte de preocupações de uma época.

Isso dito, passo ao que há de preocupante nesses protestos. Eles se sustentam em algumas das forças mais retrógradas da psique humana, que, no passado remoto e recente, coadjuvaram em vários tipos de massacres e genocídios.

Prossigamos com vagar e cuidado, começando pelas noções intuitivas de economia que estão na base das manifestações. Nossos cérebros foram moldados para operar no paleolítico. Ali, as trocas, quando havia, eram todas na base do olho por olho, dente por dente, isto é, um bem concreto, como, digamos, uma caverna confortável por uma mulher, ou uma vaca e três galinhas ou outros produtos e serviços bastante concretos. Nossa psicologia tem dificuldade para lidar com as abstrações matemáticas envolvidas na economia moderna, como dinheiro, lucro, juros, para não mencionar verdadeiros desafios lógicos, como o mercado de derivativos e as alavancagens financeiras.
O resultado é que não temos nenhuma dificuldade para ver operários, artesãos e fazendeiros como produtores de valor. Eles, afinal, transformam coisas de menor valor em alimentos ou objetos dos quais temos necessidade para sobreviver.

O mesmo não se aplica a comerciantes e outros intermediários, aos quais chamamos pejorativamente de "atravessadores" --como se a logística de levar produtos das fábricas e hortas para as gôndolas dos supermercados não valesse nada.

Em pior situação ainda estão os pobres banqueiros (nunca achei que utilizaria o adjetivo "pobres" para qualificar o substantivo "banqueiros", mas para tudo há uma primeira vez). Para nossos cérebros pré-históricos, emprestar dinheiro a juros é muito mais uma exploração do que um serviço. Quase nunca nos vem à mente que os níveis historicamente extraordinários de riqueza global de que hoje desfrutamos, que podem ser medidos em termos de calorias por habitante e até de expectativa de vida, só se tornaram possíveis graças ao comércio e aos mecanismos financeiros.

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