Opinião

Quadro desalentador

O Estado de S.Paulo - Editorial
Confirmando o que já havia sido apontado pelo Sistema de Avaliação da Educação Básica, os números do último Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) mostram que o Brasil continua com uma educação de péssima qualidade e desigual. Além de revelar que a participação das escolas públicas entre as melhores do País está em queda, o Enem de 2010 mostrou que a rede particular também teve um desempenho pior do que o esperado.

Criado em 1999 para avaliar a qualidade do ensino médio, o Enem é uma prova voluntária que há dois anos foi convertida em mecanismo seletivo de universidades públicas e particulares, por meio do Sistema de Seleção Unificada (Sisu). Em 2010, o teste atraiu cerca de 4,6 milhões de concluintes do ensino médio de 23,9 mil escolas públicas e privadas localizadas em 1.689 cidades do País. A nota média dos estudantes foi de 553,73 pontos, numa escala de até mil. A nota considera o desempenho na redação e nas provas objetivas.

No Enem de 2010, nada menos do que 8.926 escolas públicas - o equivalente a 75% da rede oficial - ficaram abaixo da média. Das 20 escolas com as maiores médias, 18 são particulares e somente 2 são públicas. As 20 escolas com as piores médias são públicas. Entre as mil escolas com as médias mais baixas, 995 são públicas e apenas 5 são privadas. Das mil escolas com as médias mais altas, 912 são particulares e 88 são públicas.

No grupo de elite, que reúne as melhores escolas, o número de unidades da rede pública, proporcionalmente ao número de escolas da rede privada, caiu de 8,4% para 7,9%, entre 2009 e 2010. E as escolas da rede oficial que ficaram no topo são, na maioria, colégios de aplicação ligados a universidades federais, escolas técnicas e escolas mantidas por corporações militares. Ou seja, são estabelecimentos educacionais que têm poucas vagas e adotam um processo seletivo tão disputado quanto os vestibulares das mais conceituadas universidades. Nas demais unidades da rede pública, cuja grande maioria está a cargo dos Estados, não há exame para preenchimento das vagas.

A rede pública atende cerca de 88% dos alunos do ensino médio. Segundo os especialistas, para alcançar o nível de formação de seus colegas da rede particular, os estudantes da rede oficial teriam de estudar mais dois anos, no mínimo. A maioria desses estudantes conclui o ensino médio com a formação que deveria ter ao deixar o ensino fundamental.

Em resumo, os resultados do Enem de 2010 atestam a falência do ensino médio público. O ministro da Educação, Fernando Haddad, por diversas vezes afirmou que este é o principal gargalo do sistema educacional. Para muitos pedagogos, o ensino médio é a principal vítima da falta de continuidade de políticas educacionais e do costume dos governadores de usar a rede escolar oficial com propósitos eleiçoeiros.

Frequentemente, para marcar sua gestão, o secretário interrompe os planos da gestão anterior e tenta implantar projetos novos, esquecendo-se do que é básico - boas condições de trabalho, salários dignos e boa relação entre alunos e professores. Com isso, as Secretarias Estaduais da Educação vão engavetando uma sucessão de planos muitas vezes irrealistas e mirabolantes, enquanto há escolas sem professores e funcionários de apoio e outras em que os docentes, além de desmotivados, são obrigados a trabalhar fora de sua área de formação.

Já a queda na pontuação de escolas particulares tradicionais - especialmente em São Paulo - não causou maiores preocupações aos pedagogos. Segundo eles, como a USP e a Unicamp não levam em conta os resultados do Enem em seus exames vestibulares e como são poucas as opções de cursos oferecidos por universidades federais em todo o Estado, os melhores alunos das escolas privadas não se interessam pela prova.

As informações proporcionadas pelo Enem de 2010 mostram, assim, que a rede pública de ensino médio continua à deriva e que nem o governo federal nem os governos estaduais parecem saber o que fazer para mudar esse quadro desalentador.

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