Ramalhete de "causos"


Tempo de gambá

José Ronaldo dos Santos
A partir do mês de abril, desde o tempo dos tupinambás, é costume caçar gambás. E isso vai até o final de junho. Depois é tempo de respeitar o cio e o período de gestação dos bichinhos para que nunca falte tão precioso recurso à nossa alimentação. Assim ainda pensam e agem os pobres caiçaras. Outros pobres, vindos de outras terras e pertencentes a outras culturas não sabem disso, não respeitam os ciclos dos outros seres no ambiente que gerou a cultura caiçara. Resulta disso e da maldade congênita em muitos a matança por matança, o risco de extinção de muitos seres que conosco compartilham esta terra (e esta Terra!).

O causo de hoje ocorreu no Perequê-mirim, em agosto de 1970. Portanto, já fora da época de caçar gambás. Foi assim:

Numa manhã, quando se dirigia ao trabalho, o Argemiro, o jardineiro, encontrou o Gusto, o “pobre de espírito”, com um cumbu pesado, isto é, com gambá dentro, ainda vivo. Logo foi dizendo: “Sorta o bicho, Gusto. Não vê que já passô do tempo?”. “Que nada! A bicha tá gorda!”. Depois que o outro retrucou, o meu estimado jardineiro pensou numa maneira de vencer pela psicologia. Apelou para o estado do bicho: “Está prenha pra dar ao mundo uns cinco filhotes. Quem sabe não caiu na armadilha porque tinha desejo iguá às nossa mulhé? Sorta a pobre mãe". “Não. Não sorto. Tive trabalho, pus banana das boa!”. Novamente, diante da teimosia do outro, o Argemiro “rezou uma ladainha” que se encerrou desta forma: “Sorta o bicho porque a carne já não presta, pode até fazê mal pra quem comê". É aqui que entra o assombroso, a resposta do Gusto: “Não tem problema! Não se preocupe com isso! Não é pra mim! É pra mamãe!”.

Sugestão de leitura: Capitães da areia, de Jorge Amado

Boa leitura!

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