Segredos de Estado e liberdade de imprensa

Do Ex-Blog do Cesar Maia
WikiLeaks voltou a levantar a discussão sobre segredos de estado, responsabilidade criminal de quem os abre, limites da imprensa e opinião pública, ao divulgar os arquivos das embaixadas dos EUA. Nos últimos 30 anos esta é a segunda vez que isso ocorre em relação ao governo dos Estados Unidos.

Em 1971, o jornal New York Times começou a divulgar documentos secretos do Pentágono, vazados por Daniel Ellsberg, um analista de primeiro escalão que focalizava a guerra do Vietnam. Chocado com o que os presidentes e secretários de estado e de defesa diziam e o que os documentos internos revelavam, mentiras que propagavam, Dan Ellsberg viveu conflito de consciência, sobre se os documentos relativos deveriam ser vazados.

Os documentos cobriam os governos Kennedy, Johnson e Nixon relativos à escalada no Vietnam. Ellsberg decidiu vazá-los em 1969. Eram 37 blocos com 7 mil páginas. Levava os documentos por partes e a noite os copiava, processo lento que não duraria menos que um ano.

Ellsberg sondou políticos e jornalistas como vazar. Finalmente, em contato com o New York Times e após avaliação dos riscos pelos advogados do jornal, os documentos começaram a ser vazados em 1971. O governo Nixon-Kissinger confrontou e conseguiu liminar na justiça. Em seguida, o Washington Post assumiu a publicação. E, assim -liminar a liminar- 17 jornais foram publicando. Finalmente, um senador que fazia obstrução e para isso dormia na comissão, aceitou ler os documentos e determinou a publicação nos Anais do Senado.

Ellsberg foi preso e condenado. Conseguiu pagar fiança para recorrer. As penas eram de pelo menos 20 anos. O New York Times levou o caso à Corte Suprema, que decidiu pela liberdade de imprensa, respaldando a decisão do jornal e registrando uma decisão considerada a mais importante sobre o exercício de liberdade de imprensa com peso de uma emenda constitucional. Os recursos dos advogados de Ellsberg ganharam força e ele terminou sendo absolvido. Esses fatos levaram Nixon a criar uma equipe de espionagem, o que culminou com o caso Watergate.

O caso foi divulgado amplamente por todos os meios de comunicação semanas seguidas. Mas isso não foi suficiente para impedir a reeleição de Nixon. O reatamento com a China teve mais peso. Watergate, um caso de proporções muito menores, porém mais fácil de se entender as relações de causa e efeito, e responsabilidade presidencial, culminou com a renúncia de Nixon, menos de 2 anos depois. Ellsberg esperava que a desintegração do governo Nixon-Kissinger viesse com os fatos extremamente graves que vazou. Seus conflitos de consciência aumentaram, agora em relação às reações da opinião pública em casos que exigem mais que a leitura das manchetes dos jornais e destaques na TV. De certa maneira, tem sido esta a dinâmica do WikiLeaks, pelo menos até aqui.

Os diretores Judith Ehrlich e Rick Goldsmith transformaram o caso Ellsberg em um documentário que concorreu ao Oscar em 2010 nessa categoria: "O Homem mais perigoso da América", título extraído de uma declaração de Kissinger. O documentário de uma hora e meia se encontra disponível a quem interessar. Vale ver.

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