Opinião

As finanças dos Estados

O Estado de S.Paulo - Editorial
A dramática situação financeira encontrada por alguns governadores que iniciaram seu primeiro mandato em 1.º de janeiro mostra que a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) - que já produziu resultados muito satisfatórios, moralizou a gestão das finanças públicas em todos os níveis e inibiu fortemente o mau uso do dinheiro do contribuinte - não foi observada por seus antecessores.

Dos 14 novos governadores (os demais foram reeleitos), pelo menos 6 enfrentam sérios problemas de caixa e não estão podendo pagar em dia diversos compromissos, como repasses devidos aos municípios, pagamento da parcela da dívida com a União e de fornecedores. É um quadro preocupante, que deve resultar em pressões políticas sobre o governo federal, que também tem problemas na área fiscal.

Uma das situações mais graves, segundo reportagem do jornal O Globo, é a do Rio Grande do Norte, onde a equipe da nova governadora, Rosalba Ciarlini (DEM), encontrou em caixa apenas R$ 611 mil, e, até o dia 4 de janeiro, venceram compromissos de R$ 48,6 milhões (repasse da parcela constitucional do ICMS para os municípios de R$ 24,1 milhões, pagamento de R$ 14,5 milhões do Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica, Fundeb, e R$ 10 milhões da parcela da dívida com a União), que não foram honrados.

Situação difícil encontraram também os governadores da Paraíba, do Pará, do Amapá, de Goiás e do Distrito Federal. Em alguns desses Estados, os novos secretários da Fazenda explicam que, no ano passado, a queda dos repasses da União por meio do Fundo de Participação dos Estados (FPE) complicou a situação financeira.

Mas essa queda era de pleno conhecimento dos antigos governadores, que deixaram parte da conta para ser paga por seus sucessores (na forma de restos a pagar, isto é, despesa autorizada num exercício fiscal, mas só quitada no exercício seguinte ou até mesmo mais tarde), sem, porém, reservar recursos suficientes para isso.

A LRF é clara ao determinar que o administrador público não pode, nos últimos dois quadrimestres de seu mandato, autorizar despesas que não possam ser quitadas ainda durante seu período de governo ou deixar parcelas para serem quitadas nos exercícios seguintes, sem que haja suficiente disponibilidade de caixa para isso. A Lei de Crimes Fiscais, por sua vez, estabelece que, se o administrador não respeitar essa determinação, estará sujeito a pena de reclusão de um a quatro anos.

A aplicação rigorosa dessas leis em casos como esses certamente inibiria a sua repetição. Mas o Tribunal de Contas da União (TCU), como lembrou o economista Raul Velloso ao jornal citado, tem tolerado o lançamento de restos a pagar por administradores em fim de mandato, desde que o seu valor não supere o do início de seu mandato.

Sem ter como pagar a conta, os governadores deverão pedir socorro ao governo federal, como anunciam que farão alguns dos que enfrentam problemas graves. Embora autorize transferências voluntárias de um ente da Federação para outros (da União para os Estados, por exemplo), a LRF estabelece condições rigorosas para que o interessado receba o benefício.

O Estado que pleiteia transferências da União deve estar em dia com o pagamento de tributos, empréstimos e financiamentos devidos ao governo federal e com a prestação de contas de recursos que obteve antes, ter cumprido os limites constitucionais de aplicações em educação e saúde e estar dentro dos limites legais para a dívida líquida, para o lançamento de restos a pagar e para as despesas com pessoal.

Evidentemente, além disso, o governo federal precisa dispor de recursos, o que não parece certo, dada a difícil situação fiscal encontrada também pela presidente Dilma Rousseff, e concordar em sacrificar suas finanças para ajudar alguns Estados. Se fizer isso, governadores de outros Estados, em situação financeira mais confortável, buscarão benefícios semelhantes. Se ceder, o governo Dilma enfraquecerá os princípios da responsabilidade fiscal.

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