Opinião

A crise avança na Europa

O Estado de S.Paulo - Editorial
A próxima etapa da crise europeia poderá ser no coração da Europa rica e desenvolvida e não mais na periferia. Grécia e Irlanda já tiveram de pedir socorro para sair do buraco financeiro. Portugal está sob pressão para pedir ajuda ao FMI e aos países mais poderosos da União Europeia (UE). Grécia, Irlanda e Portugal estavam, desde o início do ano passado, na lista de países à beira de dar um calote, juntamente com a Espanha. A grande novidade, agora, é a inclusão da Bélgica nesse grupo, como se a sua dívida pública fosse motivo de preocupação no mercado. A economia belga tem sido por muito tempo uma das mais sólidas e mais estáveis do continente, mas desde o agravamento da crise mundial, em setembro de 2008, muitas imagens de respeitabilidade viraram pó.

A depreciação dos títulos belgas é atribuída, pelos analistas, à combinação de dois fatores - o alto endividamento público, cerca de 100% do PIB, e a instabilidade política. O país vive há sete meses sem um governo constituído em condições normais, porque falta acordo entre os partidos. Há um primeiro-ministro interino, mas tem faltado a política necessária para dar um rumo seguro ao país numa fase de insegurança econômica em toda a Europa. Coube ao rei Alberto II pedir ao governo provisório um plano para reduzir o déficit público.

A especulação nos mercados tem afetado principalmente os papéis portugueses, belgas e espanhóis, mas também títulos italianos têm sido negociados com cautela. O governo português programou para hoje o lançamento de novos títulos. Os Tesouros da Itália e da Espanha também devem realizar emissões nesta semana.

Autoridades portuguesas têm rejeitado as pressões para pedir ajuda ao FMI e aos demais países da UE. Os governos grego e irlandês também resistiram, mas acabaram cedendo. O Banco Central Europeu interveio no mercado, nos últimos dias, para dar sustentação aos títulos portugueses e, segundo informações não oficiais, também a papéis de outros países. Mas esse tipo de auxílio é considerado insuficiente, no setor financeiro, para eliminar o risco de um calote na dívida pública. Segundo o governo português, será preciso levantar cerca de 20 bilhões para liquidar compromissos até abril, mas a solução mais segura, segundo analistas, seria um programa de ajuda com prazo de uns três anos.

O governo do primeiro-ministro José Sócrates iniciou há meses um programa de ajuste para reduzir o déficit público. O resultado ficou abaixo de 7,3% do PIB em 2010, segundo as autoridades, mas o número ainda não foi fechado. A meta para 2011 é chegar a 4,6% do PIB. Uma previsão mais segura seria 6,4%, de acordo com o Deutsche Bank. De toda forma, a perspectiva de mais um ano de recessão no país é apontada por analistas como um bom motivo de preocupação: com o baixo nível de atividade, o Tesouro dificilmente arrecadará o necessário para cobrir os compromissos do ano.

O temor das dívidas soberanas continuou prejudicando o desempenho das bolsas europeias nos últimos dias. Houve alguma reação, na terça-feira, quando o ministro das Finanças do Japão, Yoshihiko Noda, confirmou a disposição de seu governo de comprar títulos da Linha Europeia de Estabilidade Financeira, um fundo de 440 bilhões criado em 2010 para ajudar os países em crise. Está programada a emissão de papéis neste mês e o Japão poderá ficar com mais de 20%. Autoridades chinesas também prometeram ajuda.

O reforço desse mecanismo poderá facilitar o socorro aos países com dificuldade para refinanciar suas dívidas. O FMI, de toda forma, continuará pronto para ajudar a União Europeia a enfrentar esses problemas. Mas será preciso muito mais que isso para a prevenção de crises. Neste ano o bloco vai inaugurar um sistema de acompanhamento e controle das políticas fiscais dos países-membros. Deve ser algo bem mais rigoroso que os acordos anteriores sobre limites para o déficit público e para endividamento. Esses limites foram estourados com uma facilidade escandalosa até para os velhos padrões sul-americanos.

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