Política

Um partido patrulhado

O PSDB tem vergonha de defender os valores de certa classe média. Prefere ter com esse eleitor, conservador, uma relação de concubinato. Aceita bem o patrulhamento dos adversários

Blog do Alon
Diante das condições objetivas, o PSDB saiu-se bastante bem no processo eleitoral. Elegeu oito governadores, fincados inclusive em estados fortes em economia e população, e manteve bancadas relevantes no Congresso Nacional.

Na eleição presidencial fez 44% dos votos válidos no segundo turno, quando a aprovação do governo adversário beira a unanimidade. Claro que ganhar é sempre infinitamente melhor do que perder, mas ter o apoio de quarenta e quatro em cada cem eleitores que saíram de casa para votar não foi pouco.

Ainda mais quando um presidente como o que sai se joga e joga o governo na campanha do jeito que fez.

Mas derrota é sempre derrota, e abre-se uma temporada de disputa algo renhida por espaços, por liderança. O ensaio preliminar para a luta de mais adiante (2014) parece ser a troca (ou não) de guarda na presidência do partido, agendada para a primeira metade do ano que vem.

O país sairia ganhando se a disputa no PSDB, chamada por alguns de “refundação”, acontecesse com algumas pitadas de petismo, ainda que hoje o próprio PT tenha abandonado certos rituais.

Refiro-me à obsessão por teses, documentos, divergências colocadas por escrito, resoluções formais. Falta um pouco disso ao PSDB. Colocar no papel, preto no branco, o que propõe para o Brasil de diferente em relação ao governo que aí está.

Vem sendo um problema tucano nesta década de hegemonia federal petista. Sabe-se o nome dos candidatos a conduzir a sigla de volta ao poder, mas não se tem ideia definida sobre o que propõem. Ou no que diferem entre si.

Sem falar na pergunta sem cuja resposta dificilmente a legenda chegará ao porto seguro.

“No que exatamente um Brasil governado pelo PSDB seria melhor do que é hoje?”

Os tucanos comportam-se como se tivessem algum direito de origem divina ao poder. Um destino glorioso inevitável, explicável por expressões dogmáticas, como “superioridade na gestão”. Que pode significar tudo, ou nada.

Mas talvez essa fuga para o nebuloso seja menos fruto da vontade que da necessidade. Como diria Guimarães Rosa, mais precisão que boniteza.

O espaço da centro-esquerda, da social-democracia, está no Brasil ocupado pelo PT. Que, como todo partido reformista, busca operar melhorias no capitalismo mas sem contestá-lo. Oito anos de PT em Brasília não mexeram na estrutura fundiária, nem no domínio dos bancos, nem na arquitetura da propriedade.

Há portanto espaço para uma “oposição de esquerda”, mas essa possibilidade está amortecida pela participação dos embriões dessa esquerda no bloco de poder reformista.

Se o PSDB não tem vocação para tal, há também espaço para uma oposição à direita do PT. Poderia ser do Democratas, não estivesse o partido tão empenhado na autodestruição.

Se o maior ativo do petismo após estes oito anos é ter acelerado o ingresso dos pobres na classe média, com a formalização do trabalho e a ampliação do crédito, é verdade também que essa classe média robustecida não necessariamente vota no PT ou gosta do PT.

Os resultados eleitorais de outubro foram esclarecedores a esse respeito.

Nota-se porém no PSDB certa ojeriza, certo horror a caminhar por aí. Do que muitos tucanos gostariam mesmo seria receberem do PT um tratamento de “iguais no progressismo”. Um certificado de que -ufa!- não são “de direita”. O problema é que para receber tal certificado será preciso aderir, abrir mão do projeto de poder.

O PSDB lida mal com os valores e desejos de certa classe média emergente, que não se sente tão bem representada pelo PT. Tem vergonha de defendê-los. Prefere estabelecer com esse eleitor, conservador, uma relação de concubinato. Aceita bem o patrulhamento dos adversários.

Quer o voto conservador, mas não quer ser visto como conservador.

Da redução de impostos à proibição do aborto, da redução da maioridade penal à proibição do consumo de drogas, nada dessas coisas mobiliza verdadeiramente o PSDB.

Se bobear, até o PT é capaz de chegar antes nesse nicho de mercado.

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