Coluna do Rui Grilo

Para que servem os conselhos?

Rui Grilo
Além da divisão em três poderes – executivo, legislativo e judiciário – como uma forma de evitar a concentração e abuso de poder, chegou-se a conclusão que a forma representativa, através do parlamento, ainda não era suficiente pois restringia muito a participação e também não estava a salvo de corrupção e de relações promíscuas entre os três poderes. Frequentemente temos tido casos de câmaras que não fiscalizam o executivo e de judiciário que não pune os corruptos ou que toma partido, sem a isenção necessária.

Assim, os conselhos são espaços, tanto para ampliar a participação organizada da população na elaboração de propostas de políticas públicas, como para fiscalização do funcionamento e denúncia de eventuais irregularidades, de tal forma que não exponha o indivíduo e dificulte a retaliação.

Um outro aspecto, muitas vezes esquecido, é o caráter pedagógico, pois permite ao cidadão observar o funcionamento da sociedade e seus mecanismos de participação e regulação, qualificando seus participantes para cargos superiores.

Entretanto, se você participar de algum conselho vai achar que eles não servem para nada, pois estão devagar e quase parando. Os espaços entre as reuniões são cada vez mais distantes e não há o saudável hábito da leitura da ata da reunião anterior para se garantir a continuidade e a avaliação dos resultados. Sob o pretexto de tornar as reuniões mais ágeis, suprimem-se alguns ritos que, embora burocráticos, permitem maior transparência, impedindo o uso de subterfúgios.

Em geral, são mal preparadas, sem pauta definida ou com pauta muito carregada, de modo que as discussões não são aprofundadas. Rapidamente vão se esvaziando e logo não atingem quórum, contribuindo para que até os resistentes desanimem.

Se perguntar a qualquer cidadão se ele sabe quais os conselhos que existem na cidade, dificilmente encontraremos alguém que saiba. Não há a prática da divulgação de um calendário das reuniões e, muito menos a divulgação dos resultados.

No entanto, como a existência de alguns são obrigatórios para que a cidade tenha acesso a determinadas verbas, as eleições são realizadas e os cargos preenchidos, nem que para isso os candidatos sejam pegos a laço. Não há a menor preocupação em que os participantes conheçam a lei que regula o seu funcionamento. Às vezes, o participante é considerado chato quando solicita uma cópia da lei e arrumam mil desculpas para que não tenha acesso ao texto porque quem tem conhecimento tem poder e fica mais fácil manipular quem não a conhece.

Também não há um trabalho de conscientização e de tradução da linguagem burocrática para que mais pessoas entendam, tornem-se novas lideranças crescendo na participação e assumindo cada vez mais responsabilidades.

Toda vez que se cria um novo conselho há uma disputa para preencher as vagas do executivo e impedir que as pessoas mais ativas da oposição sejam eleitas. Às vezes, mesmo havendo previsão na lei, como é o caso dos conselhos distritais, eles não são criados porque representam um perigo de diminuição de um suposto poder e quem tem poder não quer abrir mão de usá-lo para os seus fins e não quer correr o risco de reparti-lo. Para isso são exigidos vários documentos provando que as entidades da sociedade civil existem mesmo e somente aquelas que tem toda a documentação em ordem podem participar. Aquelas mais ativas, porque estão em bairros mais pobres e que precisam de tudo, às vezes ficam de fora porque não tem dinheiro para pagar um contador. Outras vezes, a luta pela sobrevivência dificulta a participação em reuniões, principalmente se são realizadas no horário comercial. Nesse aspecto, a sociedade civil tem mais dificuldade porque só podem participar os que tem horário mais flexível e aposentados.

A conseqüência dessa situação é que cada vez mais vai diminuindo a participação pois os que ainda conseguem perceber o jogo de manipulações vão ficando sobrecarregados e cada vez mais vulneráveis a retaliações por parte daqueles que detem o poder. É o que o povo se chama ficar numa sinuca de bico. Vale a pena entregar os pontos ? Vale a pena ser cúmplice dessa situação?

Rui Grilo
ragrilo@terra.com.br

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