Brasil

O voto abestado

Luiza Nagib Eluf
Fui candidata a deputada federal nas últimas eleições, pelo Partido Verde. Não consegui o sufrágio necessário para ser eleita e devo confessar que nem mesmo esperava alcançar um patamar tão alto (60 mil votos), tendo em vista o pouco tempo que tive para fazer campanha. De qualquer modo, a experiência foi extraordinária. Ganha-se muito em conhecimento político e em contatos sociais só pelo fato de se entrar na corrida eleitoral. Ao mesmo tempo, compreende-se melhor os anseios das massas no momento em que se estabelece o diálogo com camadas sociais acostumadas a uma linguagem diferente, com interesses diversos e perspectivas, por vezes, limitadas. Nesse balaio de eleitores, não há melhores nem piores, mas podemos dividi-los em conscientes, camuflados, medrosos, revoltados, amistosos, interessados e interesseiros. Não apenas alguns políticos podem ser classificados de “fisiológicos”, parte dos eleitores também o são. Não apenas alguns deputados são suspeitos de atuar sem ética, os seus apoiadores por vezes também agem da mesma forma. Isso sem falar dos “abestados”...

Esse retrato do Brasil, porém, muitas vezes é distorcido. Apenas os políticos são maus, vilões, corruptos, bandidos, palhaços. Já os eleitores, esses não têm culpa de nada. Sentem-se totalmente absolvidos, apesar da alienação com que a maioria age no momento de exercer sua cidadania, deixando de votar de forma consciente e negligenciando no que se refere à sua necessária participação social. Alguns votam e se esquecem, imediatamente, em quem votaram. Uma pesquisa realizada alguns dias após o primeiro turno, mostrou que mais de 80% das pessoas já haviam se esquecido em quem votaram para senador. Por essa razão, vituperar contra os políticos é esquecer que foram os próprios eleitores que os puseram nos cargos.

Outro fenômeno que se mostra decisivo nas eleições é o fascínio pelos famosos. Qualquer sujeito que se torne amplamente conhecido, seja pelo motivo que for, receberá milhares de votos, por menos que esteja qualificado a ocupar o cargo eletivo que pleiteou.

Nossa democracia precisa de aperfeiçoamento. O debate político tem que ser intensificado, não pode ficar restrito às vésperas dos grandes pleitos e nem limitado às classes sociais mais favorecidas. Por sua vez, o voto distrital ou distrital misto é a solução para aproximar eleitores de seus representantes. Importante perceber, também, que o Estado de São Paulo está sub-representado no Congresso. O número de votos que um candidato paulista precisa para se eleger deputado federal é descomunal e injusto. Há candidatos que com cem mil votos não foram eleitos, enquanto um candidato de outro estado da Federação pode se eleger para o mesmo cargo com menos da metade desse número de votos.

É preciso lembrar, ainda, que as mulheres são apenas 8% da Câmara Federal e 13% do Senado. Nas últimas eleições, a bancada feminina encolheu. Por essa razão, ajudar as mulheres a chegar aos cargos de representação política é muito mais importante do que pode parecer. Elas são mais da metade dos eleitores.

Evidentemente, educação é um ponto fundamental, mas para que o sistema de ensino deficitário que temos hoje seja verdadeiramente alterado é preciso que o povo consiga votar com mais conhecimento de causa. A ignorância só interessa aos maus políticos e aos mercadores de votos.

Luiza Nagib Eluf é Procuradora de justiça do Ministério Público de São Paulo. É autora de vários livros, dentre os quais “A paixão no banco dos réus”.

Twitter

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Mosca-dragão

Pegoava?

Jundu