Coluna do Rui Grilo

Apesar de você

xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx“Hoje você é quem manda
xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxFalou, tá falado
xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxNão tem discussão, não.
xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxA minha gente hoje anda
xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxFalando de lado e olhando pro chão.”

Rui Grilo
Em 1971, cursava filosofia na Faculdade Sedes Sapientiae, que ficava entre as ruas Marques de Paranaguá e a Caio Prado, perto do início da Augusta e da Consolação, um prédio austero mas cercado de verde, onde pulsava a inquietação com a situação política do país.

Uma tarde, quando cheguei, vi afixado na parede do pátio a letra de “Apesar de Você” do Chico Buarque. Várias pessoas olhavam enquanto algumas comentavam que a música acabara de ser proibida e, num sinal de protesto, alguém havia afixado a letra na parede.

Confesso que, depois de muitos anos, depois das “diretas já”, da lei da anistia e da redemocratização do Brasil, sentia aqui em Ubatuba um pouco do clima de medo e de coação daquela época. Na última campanha eleitoral, quando vi o atual prefeito subindo a Rua da Cascata, cercado de funcionários públicos, me lembrei da “Marcha da Família com Deus e pela Liberdade”, que precedeu ao golpe militar.

Nesse final de semana, nas diferentes rodas de conversa, o assunto era a a decisão da justiça que afasta do cargo o vereador Biguá, seu filho André e o funcionário público municipal José Augusto da Silva, e que que pede a condenação por improbidade administrativa e a quebra do sigilo bancário e fiscal do prefeito Eduardo César, do chefe de gabinete Délcio José Sato e da Secretária de Fazenda Vera Lúcia Ramos, inclusive dos cônjuges e filhos.

As reações são as mais variadas. Muitos dizem que não vai dar em nada, que vai dar pizza mais uma vez. Outros querem saber se eles estão presos, como se desconhecessem o ritmo lento da justiça. Outros demonstram uma sensação de esperança e de que um sonho mau está acabando; uma sensação de desforra e de alegria, como na letra do Chico:

xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx“Apesar de você
xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxamanhã há de ser outro día.
xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxEu pergunto a você onde vai se esconder
xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxDa enorme euforía?”
 
À medida que a poeira vai baixando surgem outras reflexões: se o prefeito tem maior poder de interferir nas investigações e de coagir possíveis testemunhas, porque apenas os funcionários e o vereador foram afastados?

Outra pergunta que surge é: quem será que teve a coragem de fazer a denúncia? Quem será que rompeu com o raciocínio de que é preferível ser covarde vivo que herói morto?

Há também muita expectativa sobre a atitude que a Câmara vai tomar, visto que o principal papel do Legislativo é fiscalizar o Executivo. Será que os vereadores vão continuar a tratar de temas tão relevantes como moções de congratulações e de instalação de placas de ruas e de telefones?

Se o Executivo está sendo condenado por omissão, porque não acontece o mesmo com a Câmara?

Rui Grilo
ragrilo@terra.com.br

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