Opinião

As sanções contra o Irã

Editorial do Estadão
Há mais dúvidas sobre o que os Estados Unidos efetivamente esperam da quarta rodada de sanções contra o Irã, que fizeram aprovar anteontem no Conselho de Segurança (CS) da ONU, do que sobre a determinação iraniana de chegar ao limiar da produção da bomba atômica - o que as punições visariam a impedir. Em defesa da adoção das medidas, os americanos e os seus aliados europeus usaram duas ordens de ideias, não apenas contraditórias, mas afinal inconvincentes, à luz do que se aprovou e de como se deu a votação no CS.

De um lado, o que a secretária de Estado Hillary Clinton chamou "as sanções mais significativas que o Irã já teve de enfrentar" tornariam exorbitante o custo político e econômico do programa nuclear da República Islâmica, obrigando o seu governo, ao fim e ao cabo, a negociá-lo a sério, pela primeira vez, com a comunidade internacional. De outro lado, a importância das sanções estaria "menos no seu conteúdo específico do que no isolamento do Irã pelo resto do mundo", na versão do secretário de Defesa Robert Gates.

A teoria do duplo trilho - punir e negociar - foi de fato contemplada na resolução do Conselho. O documento reproduz uma oferta concebida em 2008 pelo chamado grupo 5+1 (Estados Unidos, Rússia, China, França, Grã-Bretanha e Alemanha). Em troca da desistência de enriquecer urânio, o Irã teria reconhecido o seu direito à energia nuclear, recebendo ainda ajuda econômica e garantias de segurança. Mas a condição necessária para arrastar o Irã ao diálogo seriam as "sanções paralisantes" que atingissem o coração de sua economia.

Se dependesse dos EUA, a importação de petróleo iraniano e a venda de derivados ao país seriam embargadas até que Teerã se sentasse para conversar. No entanto, desde que se decidiram pelas sanções - depois da recusa inicial do presidente Mahmoud Ahmadinejad de enviar urânio para enriquecimento no exterior -, os americanos foram levados a perceber que as chances de aprovação de novas punições com o apoio da Rússia e da China eram inversamente proporcionais à sua dureza. Em tratativas intermináveis, os chineses diluíram o quanto puderam o projeto original.

As sanções ampliam o veto ao comércio de armas pesadas com o Irã, expandem o rol de empresas e autoridades iranianas na lista negra internacional - em especial a Guarda Revolucionária, que controla metade da economia nacional e o programa nuclear -, restringem as transações financeiras com o país e preveem a inspeção consentida de cargas destinadas ao Irã ou ali embarcadas. É quase unânime, porém, a avaliação de que isso tudo não tornará proibitiva a operação nuclear iraniana, muito menos abalará a posição desafiadora e o poder da teocracia de Teerã.

Já o objetivo de isolar o Irã não teria sido alcançado. Embora Washington tenha conseguido a adesão de Moscou e Pequim, em troca de concessões e recompensas, pela primeira vez um pacote anti-iraniano não foi aprovado por unanimidade ou apenas com abstenções. Brasil e Turquia votaram contra (e o Líbano se absteve). O dissenso reduziu a força simbólica das sanções. E os votos favoráveis da Rússia e China não alteram a intensidade de suas relações econômicas com o Irã. Os russos constroem ali um reator nuclear. Os chineses, principais parceiros comerciais da República Islâmica, procuram petróleo e constroem refinarias no país, cuja economia depende do setor energético em 80%.

Se assim é, por que as sanções? "Porque não sabemos o que mais fazer", responde o diretor do reputado Programa de Segurança Internacional da Universidade Harvard, Steven Miller. Porque os americanos precisam dissuadir Israel de bombardear as instalações nucleares iranianas, especulam outros. Porque o presidente Barack Obama precisava aplacar a oposição, acusam os críticos. Porque - e esta parece ser a explicação mais plausível - a resolução abre caminho para as muito mais severas sanções unilaterais que os EUA e países da União Europeia pretendem adotar.

Fica a pergunta: se as represálias não funcionarem, sobra o quê? Uma ação militar, diz o chefe do Estado-Maior das Forças Armadas americanas, almirante Mike Mullen, seria a "última opção".
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