Opinião

Um vexame europeu

Editorial do Estadão
A Europa fracassou em seu primeiro grande teste de cooperação e permitiu um assustador agravamento da crise iniciada em Atenas. A Grécia acabará sendo salva e o efeito dominó será interrompido, se as autoridades da zona do euro se mexerem nos próximos dias. Mas o estrago terá sido bem maior do que teria sido se os governantes das maiores economias da área tivessem demonstrado firmeza política e liderança. O ministro das Finanças da Alemanha, Wolfgang Schaeuble, reafirmou nessa quarta-feira a disposição de seu governo de participar do socorro financeiro à Grécia. A declaração foi feita depois de uma reunião, em Berlim, com o presidente do Banco Central Europeu (BCE), Jean-Claude Trichet, e o diretor-gerente do FMI, Dominique Strauss-Kahn. Trichet pediu uma decisão rápida ao Parlamento alemão para a liberação do dinheiro - cerca de 8,4 bilhões em 2010.

A crise fiscal da Grécia tornou-se notícia em todo o mundo no começo do ano. O Tesouro grego estava quase quebrado e superendividado e, se entrasse em moratória, a reação do mercado poderia afetar outros países com as contas públicas em condições precárias. Na primeira reação, os governantes das principais economias da zona do euro vacilaram: a União Europeia não poderia ajudar um governo com problemas fiscais. Mas o risco de contaminação se tornou cada vez mais claro e uma solução igualmente óbvia foi sugerida. Cada governo poderia, como se agisse individualmente, pingar uma contribuição.

Combinou-se, nesse momento, evitar o recurso ao FMI. O Fundo havia ajudado vários países da União Europeia, desde 2008, mas nenhum da zona do euro. Um auxílio semelhante a um país-membro da união monetária seria vexaminoso. Até dirigentes do BCE se opuseram à participação do FMI na ajuda à Grécia.

Enquanto se perdia tempo, o mercado financeiro aumentava as apostas na insolvência grega e na contaminação de outros países. Decidiu-se, enfim, montar um pacote de ajuda. A chanceler alemã, Angela Merkel, e o presidente francês, Nicolas Sarkozy, anunciaram apoio à operação de socorro depois de uma reunião separada. Outros dirigentes da zona do euro concordaram. Até autoridades britânicas defenderam a iniciativa. Decidiu-se, além disso, admitir a participação do FMI. Afinal, a ajuda seria cara e algum reforço financeiro seria bem-vindo. Os países da zona do euro entrariam com cerca de 30 bilhões e o Fundo ajudaria com uns 15 bilhões.

Essa decisão de organizar o socorro à Grécia foi anunciada em 25 de março, logo depois do encontro de Merkel e Sarkozy e pouco antes de uma reunião de governantes da zona do euro com dirigentes da União Europeia. Passou-se um mês e nenhuma iniciativa realmente séria foi registrada na Europa. Na Alemanha, o governo deixou o tempo correr, sem pressa, por causa de eleições estaduais e da oposição de parte do eleitorado à ajuda à Grécia. Os dirigentes alemães parecem ter sido incapazes de mostrar ao público, durante esse tempo, as prováveis consequências de um calote grego e os custos para toda a zona do euro. Seus colegas de outros países foram igualmente omissos. Faltou liderança em cada país e também no conjunto do bloco.

O FMI foi mais rápido. Iniciou as negociações com o governo grego, em torno de um programa de ajuste de estilo tradicional, com critérios de desempenho e condições severas de ajuste. São condições pelo menos tão rigorosas quanto as alardeadas pela chanceler Angela Merkel e desenhadas por funcionários com maior experiência nesse tipo de assunto. Mas os alemães e governantes de outros países parecem não ter percebido ou valorizado suficientemente esse detalhe.
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