Shoper


Fica para a próxima estação

Ricardo Pimentel
Outono. Bastava chegar a primavera que a gente tinha encontro previamente agendado. Depois, quem sabe no verão. Tudo ia depender dos resultados eleitorais deste ano. Se a fatura fosse liquidada logo no primeiro turno a gente já se via em outubro, caso contrário somente após a segunda quinzena de novembro. E ainda, tendo resultado positivo haveria negociação para uma bonificação de campanha com o mês de janeiro inteirinho em Ubatuba.

Mas a vida é uma verdadeira caixinha de surpresas. A vida é uma fina linha tênue que desafia o outro lado da existência. O seu ciclo é fatal, infalível. Foi assim com o meu amigo Shoper que nesta semana saltou rumo ao desconhecido. E assim, deixando para trás todos os planos. Partiu na madrugada de terça-feira quando foi acomedido por um infarto fulminante.

Roberto Nunez de Lima, este é o seu nome de batismo. Iria completar seus 57 anos na próxima semana. Um dia, revelou que ganhou o apelido de Shoper ainda em criança. Gostava do apelido. Sabia que quando recebia ligações telefônicas solicitado por seu nome completo, era gerente de banco ou outros credores e este nunca estava. Já, quando era chamado por Shoper eram amigos para convidar para ir a praia, beber cervejas e outras coisas do gênero.

Foi uma pessoa interessante do ponto de vista físico e estético, e, principalmente, intelectual. Alto, magro, desengonçado, detentor de uma inteligência ímpar, rara. Apreciador do rock, do jazz e da fina MPB. Também apreciava um bom whisky escocês e charutos cubanos. Mas, nas vacas magras valia um Old Eight e charutos nacionais Alonso Menedez. Costuma dizer que possuía fino paladar e postura elitizada, mas que faltava apenas o numerário para patrocinar as boas coisas que a vida proporciona.

Lá estava Shoper, em Curitiba traçando seus planos. Neste pleito, Beto Richa seria seu candidato. Teria participação no marketing da campanha. Deusa, sua esposa, já estava a todo vapor na mobilização eleitoral. A expectativa da vitória era quase que uma certeza.

Por aqui, nós também estamos nos preparando para ingressar no processo eleitoral, deste vez em campanha majoritária no norte do país. Este é um momento muito interessante profissionalmente. Afinal, somos apaixonados pelo marketing eleitoral, é um desafio que nos move de dois em dois ano. É a oportunidade de ganhar uma bela grana e fortalecer ainda mais o nosso portifólio. E depois de tudo as nossas merecidas férias, um brinde ao ócio. Trocávamos figurinhas pelo MSN. Havia a cumplicidade de no final dos pleitos um abrir porta para o outro nas praças vencedoras.

Em minha vida, Shoper foi um dos mais interessantes profissionais de marketing político que já conheci e um dos poucos amigos que restavam. Afinal, está imortalizado no livro “Notícias do Planalto” de Mário Sérgio Conti (Editora Companhia das Letras 1999). Reconhecido profissionalmente como criador e produtor do maior case do marketing político brasileiro, Rede Povo, mote da campanha de Lula a Presidente da República em 1989. E tem até foto do nosso amigo!

Fez várias campanhas importantes no país como Suplicy, Mercadante e muitas outras. Em 1990 fundou sua própria agência, especializada em Marketing Sindical, a Terra Nova Propaganda. Em 1992, esbarramos com o Shoper na campanha vencedora do Sindicato dos Bancários no Rio de Janeiro. Conseguimos derrubar a Convergência Socialista (atual PSTU) e tinha até o Lula em nossas reuniões. Fazíamos parte da comunicação da campanha da chapa da Articulação. Neste momento ainda não ficamos amigos, apenas nos conhecemos por aquele período.

Shoper adotou Ubatuba definitivamente para viver e morar após conduzir as campanhas de Zizinho e Antônio Carlos em Caraguá. Em 1996 já tivemos uma campanha em Ubatuba com ingredientes publicitários fortes. Shoper lança o teaser do “Z”, que tinha a leitura da justiça do Zorro. O candidato já era a bola da vez e com um markerting amarrando todas as pontas, garantiu uma vitória esmagadora. A partir de 2000 nos tornamos amigos, definitivamente. Eu, Marcelo Pimentel, e Luizinho tivemos a oportunidade de convidá-lo para trabalhar em meia dúzia de campanhas municipais. Com certeza, aprendemos muito. Era um verdadeiro guru eleitoral. Sua fala, sua explanação, seu conhecimento, sua interpretação da conjuntura impressionavam nossos candidatos que se sentiam ainda mais seguros para prosseguir na busca da vitória. Formamos uma bela equipe de trabalho.

Por aqui, faltou um pouco de reconhecimento profissional do stablemam municipal. Talvez não tenham alcançado o raciocínio. Irreverente, fez amigos. Mas, também fez inimigos. A sua máxima e marca era que perdia o amigo, mas não perdia a piada. Este foi o percussor de uma pitadinha de profissionalismo em campanhas políticas no município, quando introduzimos a ferramenta do telemarketing em campanha eleitoral, isso em 2000. De lá pra cá, Shoper não teve mais espaço profissional até mudar-se de vez para Curitiba, onde estava reconstruindo sua carreira e conquistando seu merecido espaço.

Seu sonho era voltar para Ubatuba definitivamente. Tinha planos de mais uns oito anos, no máximo, no sul do país. Já estava em tratativa com o PT de Ubatuba para conduzir o próximo pleito municipal e assim ficar mais na cidade.

Por fim! Shoper partiu em uma nuvem vermelha para a próxima estação e com certeza a gente se encontra lá, em uma outra esfera. Fica aqui o meu adeus sideral. Só me resta colocar as minhas mãos nos bolsos traseiros e seguir, um pouco mais só. A vida é bela, a vida é vela. Um imenso e fraterno abraço ao amigo que ficará guardado em nossas memórias.

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Comentários

Allan Ricardo disse…
Oi Ricardo. A notícia da perda do Shoper chegou pelo Celso Teixeira, que falou com a Simone que triste, me transmitiu a perda de mais um amigo. Os anos passam e percebo que a cada um mais amigos se vão. Minha convivência com o Shoper foi bem menor que a sua, da Elaine do Marcelo e do Luizitos, porém sempre achei aquele "cara desengonçado" alguém interessante para ouvir e depois de um ou dois dias entender o que realmente queria dizer. Figura interessante, que certamente nos deixa antes da hora. Pena que não aprendemos mais, que o tempo foi curto, e que nós não estávamos preparados para aproveitar seus ensinamentos. Vá em Paz, seu lugar em nossa memória nunca será ocupado.

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