Papo do Editor

Irã, ora se me lembro...

Sidney Borges
Tenho lembranças esparsas dos acontecimentos do Irã e vou relatá-los aqui. O que escrevo é fruto de minha memória, o tempo distorce as coisas, mas eu me recordo com nitidez do Xá da Pérsia na tela do Reporter Esso. Hoje o Irã está presente nos jornais do mundo. Dizem que o governo do presidente Ahmadinejad pretende construir a bomba. Só de pensar nisso o americano médio corre ao McDonald's e deglute dois Big Macs e uma Coca gigante. O Irã tem contas a ajustar com a Inglaterra e os Estados Unidos. Em 1953, por obra da CIA e do serviço secreto britânico (MI-5), o líder nacionalista Mohammed Mossadegh foi afastado. Imaginem os leitores que o distinto teve a audácia de contrariar interesses ingleses.

Os americanos afirmam que entraram de gaiatos no navio pois tinham medo de um Irã próximo da União Soviética e, por via das dúvidas, deflagraram o golpe. O povo iraniano foi humilhado, espezinhado, teve a espinha dorsal curvada pelo imperialismo anglo-americano. Sem alternativa a nação persa engoliu o Xá Reza Pahlevi e seus problemas mundanos, enquanto ingleses e americanos enchiam a burra com os lucros do petróleo. Melhor sorte teve o Brasil que só foi obrigado a engolir Zagalo.

Essa é a verdade histórica, incontestável e de conhecimento público. O Xá não tinha jeito nem apetite para administrar o país, era um playboy internacional. Vivia em festas na Riviera Francesa ao lado de belas mulheres e iates majestosos. Vida podre, mas não de todo má. No Brasil o nome Soraya tornou-se popular, há muitas por aí. Homenagem à bela mulher do Xá que por não conseguir lhe dar um herdeiro foi substituída. Nas reuniões familiares, meus tios falavam do gol perdido por Baltazar enquanto em outra sala as mulheres choravam lembrando os belos olhos da princesa estéril.

O tempo passou e o regime tornou-se impopular e cada vez mais repressivo, enchendo as prisões de dissidentes políticos. A ferocidade da Savak, polícia secreta do Xá, só fez aumentar a revolta.

Um dia o Xá caiu de maduro, nem o apoio americano funcionou para mantê-lo no trono. O poder foi assumido pelo lider religioso xiita Ruhollah Musavi Khomeini.
O Irã mudou de face, tudo o que lembrasse o ocidente e os Estados Unidos passou a ser considerado coisa do diabo. Instalou-se no país outra ditadura, desta vez à prova de golpes da CIA, mas como todas as ditaduras, repressiva e criminosa.

Nos dias atuais o Brasil é um dos raros países que apóia o programa nuclear iraniano. O Itamaraty acredita que tenha fins pacíficos. Os Estados Unidos, com longa tradição de interferências em casas alheias, sem convites, mantém tropas combatendo no Iraque e no Afeganistão e conclama o mundo a condenar o Irã. Israel teme que os iranianos desenvolvam armas nucleares e possam desequilibrar o instável panorama do Oriente Médio.

O que virá ninguém sabe. Atacar o Irã é uma possibilidade que Estados Unidos e Israel devem estar cogitando. Melhor seria se não o fizessem. Também seria prudente o presidente Ahmadinejad parar de matraquear aos quatro ventos coisas sem propósito.

O final do ciclo do petróleo está próximo, em vinte ou trinta anos não dependeremos mais do óleo das profundesas e o Oriente Médio deixará de ser importante. Tâmaras, camelos e dançarinas do ventre não justificam invasões e guerras.

Não é simples emitir juízo sobre a posição brasileira em relação ao Irã. O argumento do livre arbítrio das nações é válido, o Irã tem direito de desenvolver seus programas energéticos sem sofrer sanções ou interferências.

O que produz mal estar são as falas do presidente Lula que, boquirroto, diz coisas impróprias sem pensar nas conseqüências. O governo do Irã é uma ditadura repressiva. Prende e executa dissidentes. No mundo atual ninguém deveria ser preso por ter idéias. E nenhum democrata tem o direito de apoiar ditaduras. Ou, no fundo, não é democrata...

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