Opinião

Alguns passos na área do lixo

Washington Novaes - O Estadao de S.Paulo
Afinal, depois de 19 anos de tramitação, a Câmara dos Deputados, em Brasília, aprovou um projeto de Política Nacional de Resíduos Sólidos. Ainda terá de passar pelo Senado. Mas contém princípios interessantes. Como o que recomenda conferir prioridade aos estímulos para as cooperativas de catadores de resíduos - que, segundo as justificativas ao texto, já contam com 800 mil pessoas no País. Também dá preferência a materiais reciclados em compras da administração pública; aprova a chamada logística reversa, em que os responsáveis pelas embalagens devem ser responsabilizados pelo retorno dos resíduos nas áreas dos agrotóxicos, pilhas, baterias, lâmpadas, pneus; define que a responsabilidade pelos resíduos deve ser compartilhada por governos, empresas e sociedade. Tudo para contemplar os objetivos centrais da política, que são a redução dos resíduos, sua reutilização e - caso impossíveis - sua reciclagem. A deposição em aterros deve ser a opção final, pois só recomenda a incineração caso não haja outra possibilidade. E será proibida a catação de lixo em aterros.

São, todos eles, princípios interessantes. Mas, além de ainda terem de passar pelo Senado, não criam instrumentos práticos para enfrentar a gravíssima questão dos resíduos no País, principalmente para eliminar os lixões a céu aberto, que ainda recebem mais de metade dos resíduos totais. O projeto recomenda que se criem consórcios intermunicipais para isso e que eles tenham prioridade para receber recursos federais. Além disso, os municípios terão de fazer planos de gestão integrada de resíduos sólidos e estabelecer metas para a coleta seletiva. Paralelamente, o setor empresarial deverá "gerenciar seus resíduos", especialmente criar pontos para receber de volta resíduos problemáticos e/ou perigosos, como pilhas, baterias, lâmpadas fluorescentes, pneus, produtos eletrônicos, além de embalagens. Resíduos do saneamento, industriais, de serviços de saúde, da mineração, de empresas de construção e resíduos perigosos obrigarão os respectivos responsáveis a fazer planos de gerenciamento.

São avanços condicionados a que os princípios sejam seguidos por planos em cada Estado, em cada município, em cada setor. E que haja recursos financeiros para enfrentar a situação dramática nesse setor. Porque estamos hoje com uma realidade de cerca de 1,5 quilo de lixo domiciliar por dia por habitante e os 3.639 lixões recebendo 55 milhões de toneladas de resíduos por ano (no País, são 703 aterros adequados e 899 "controlados"). Todas as capitais mais populosas estão com seus aterros esgotados; 25 mil famílias moram em lixões. E os municípios gastam alguns bilhões de reais a cada ano, com a coleta e a deposição dos resíduos, com serviços próprios ou de terceiros (que recebem entre R$ 30 e R$ 60 por tonelada). As licitações para serviços nessa área são apontadas como um dos caminhos mais frequentes para doações ilegais nas campanhas eleitorais.

E tudo isso é um enorme desperdício, como já se escreveu aqui tantas vezes. O setor deveria, ao contrário, transformar-se em grande gerador de trabalho e renda para setores desfavorecidos. Para isso o melhor caminho é o das cooperativas de catadores. Mas ele precisa avançar, com o poder público financiando a construção e implantação de usinas de reciclagem (a reciclagem em usinas públicas não passa de 1% do total), a compra de equipamentos de coleta. Por aí é possível - como já o demonstrou em outros tempos, quando teve mais apoio, o Núcleo Industrial da Reciclagem, de Goiânia - reduzir em até 80% a deposição de resíduos em aterros. Compostando todo o lixo orgânico para transformá-lo em fertilizantes para jardins, recomposição de encostas, etc.; transformando todo o papel e papelão em telhas revestidas de betume, que substituem com muitas vantagens as de amianto; reciclando todo o PVC e transformando-o em mangueiras pretas ou pellets para empresas que os utilizam como matéria-prima; prensando latas e moendo vidros para recicladoras. E, last but not least, gerando trabalho e renda para pessoas com pouca educação formal. Sem perigo de desperdiçar o investimento, pois a cessão às cooperativas deve ser feita pelo regime de comodato renovável periodicamente.
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Comentários

Rui Alves Grilo disse…
Essa lei é muito importante e um passo nessa direção aqui em Ubatuba. Estamos negociando com a Prefeitura a implantação de uma usina piloto do Projeto Lixo Zero.
Como o projeto é inovador ainda não há uma usina instalada e depende do laudo do IPT que foi negociado e conta com o patrocínio do Ministério de Ciência e Tecnologia. Apostamos nessa idéia e esperamos que saia logo para acabar com o transbordo e com os gastos absurdos com o lixo
Anônimo disse…
AONDE SERÁ ESTA USINA,É A GRANDE PERGUNTA...ALGUÉM TEM ALGUMA SUGESTÃO ?QUEM DESEJA UMA USINA DE LIXO AO LADO DA SUA CASA ?

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