Entrevista


“Adoro confusão” – Marcelo Mirisola

Por Jovino Machado

1: Quem é Marcelo Mirisola?

Essa é boa. Eu diria que é um cara que arruma algumas encrencas e sofre por conta da confusão que fazem entre ele e uma tal de “voz em primeira pessoa”. Seria mais fácil se sofresse de heterônimos. Bastaria mandá-los dar uma volta, e eu ficaria em paz em casa, vendo televisão.

2: O que é literatura?

Trabalho, muito trabalho.

3: Se não me falha a memória você disse para a Revista Cult que é o melhor escritor de sua geração. Por que?

Naquela época o Manuel da Costa Pinto havia me convencido disso. Agora que ele resolveu me ignorar, tenho lá minhas dúvidas.

4: Você me disse que é um autor que não pensa por imagens. Como pensa o escritor Marcelo Mirisola?

Foi você – no primeiro email que mandou - quem falou que fechou meu livro e logo pensou em vários filmes, não foi?

Pois eu nunca pensei nisso, e na mesma semana o Marcelo Paiva havia me dito a mesma coisa. Aí fiquei intrigado. Uma pulga aboletou-se atrás da minha orelha porque minha ferramenta de trabalho é a palavra, sou um fiasco em matéria de som e de imagens. Se por acaso alguém me fizer uma proposta nesse sentido, vou agir da mesma forma que agi quando o Bortolotto me disse que o “Herói Devolvido” poderia virar teatro, ou seja, não vou me meter.

Imagina que operação de subtração seria roteirizar um livro como “O Azul do Filho Morto”. Jamais.

5: O Marcelo Rubens Paiva disse que o seu conto "Sobre os ombros dourados da felicidade" daria um baita filme. Quem é o diretor de cinema que tem competência para filmar um texto seu?

Sinceramente não pensei nisso. Apenas cultivo uma pulga atrás da orelha.

6: Por que voltou à Editora 34?

Porque a Record não quis o “Memórias da Sauna Finlandesa”. Eles devem ter autores mais urgentes para publicar, né? Aliás, nem a Funarte quis o Memórias da Sauna, nem a Petrobrás, nem o Pacc (sou suplente da Andréa del Fuego, sabia?) e nem a extinta bolsa Vitae – sempre me ignoraram. Ah, a Biblioteca Nacional também não quis saber do Memórias da Sauna Finlandesa, me ignorou. Você acha que o livro é tão ruim assim?

7: O que achou das críticas que saíram por aí?

Uma demonstração de imaturidade. Pra não dizer breguice e falta de preparo mesmo. No Jardim da Infância da Literatura, a primeira lição que aprendemos é: Eu é outro. Na segunda lição, aprendemos a limpar a bunda sozinhos. Será que é tão difícil de entender? Chega a ser constrangedor explicar o Padre nosso ao Vigário.

Quero dizer que armo arapucas para me distrair. Só isso. No “Memórias da Sauna Finlandesa”, por exemplo, dei voz a um acadêmico atrapalhado que vacilava entre o “mundo culto” (leia-se cafés expressos na livraria Cultura, palestras na Casa do Saber, piqueniques em Paraty, etc) e o lixinho do biombo de um salão de beleza. Dois mundos aparentemente paralelos – mas que em algum ponto teriam de se encontrar. Nenhuma novidade, Philip Roth e Coetzee trataram do mesmo tema e do mesmo conflito em várias oportunidades. A diferença é que meu acadêmico, além de confuso, também é um sujeito mau-caráter e ... brega. Bregão. Foi o que bastou para cegar ilustres sabichões ilustrados & viadinhos afins. Imagino que devam ter revirado o lixinho do biombo supracitado e encontraram suas erudiçõezinhas em meio aos buços de donas de casa despossuídas dos seus instintos mais primitivos. Cegos, esqueceram de fazer a lição de casa: qual seria o universo de uma cabeleireira que tem a Família Lima como troféu na penteadeira do salão? A quem, senão Bruno & Marrone, Gugu e Faustão, o narrador teria de recorrer não só para comer a cabeleireira, mas para contar a história?

Não vou negar, adoro confusão. Às vezes, porém, fico chocado com a falta de preparo e a ingenuidade das pessoas. Não foram, como eu disse, só os sabichões ilustrados que caíram feito patos, mas vários “colegas de ofício” que eu andei zoando e gente que justificadamente não vai com as minhas fuças, que reproduziram e reproduzem as mesmas banalidades, isto é, eles garantem (aliás, sentenciam) que eu me imiscuo com a mediocridade anunciada, logo sou um escritor tosco e medíocre. Ninguém é obrigado a gostar do que escrevo. A lógica, porém, já serviu a construções mais elaboradas. Pode-se usá-la para dar chiliques, claro que sim. A inteligência, no entanto, recomenda prudência e caldo de galinha. O contrário disso é trabalhar de graça para a burrice, mandar sorvetão na testa.

E, o pior de tudo, essa gente desconsidera a possibilidade de Bruno & Marrone como uma ferramenta de retórica. Isso sim é grave. Não só revela a incapacidade de análise, mas revela sobretudo falta de ambição intelectual, sei lá, uma espécie de jaguncismo ilustrado. Atraso mesmo. Breguice. A impressão que tenho é a de que colocaram um bando de Zé Buscapés para cuidar das galinhas de Virgílio. Só faltou dizerem “como se atreve?”. A precariedade é mesmo uma via de mão dupla – e eu faço questão de trafegar na contramão. Mas é claro que o narrador na primeira pessoa se imiscui. Eu uso e abuso da famigerada voz em primeira pessoa, qual o problema? O que essa gente pretende? Que meu narrador se valha do sermão da sexagésima para seduzir a dona de um salão de beleza chamado Art & Stilo?
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