Opinião

Duas faces da mesma moeda

Editorial do Estadão
Em 2001, o então senador José Roberto Arruda jurou pelos filhos que não tinha nada que ver com a violação do sigilo do painel eletrônico da Casa, no episódio da cassação do mandato do também representante do Distrito Federal (DF) Luiz Estevão. Dias depois, admitiu ter visto e comentado a lista dos votos de seus pares e renunciou ao mandato para não ser cassado. Na segunda-feira, reunido com a cúpula do seu partido, o DEM, o governador José Roberto Arruda avisou que não se desfiliará da sigla porque se considera inocente da acusação de chefiar o esquema de pagamentos regulares de propinas a assessores, secretários e deputados da Câmara Legislativa do DF, além do vice-governador Paulo Octávio, com recursos arrecadados de empresas fornecedoras da administração distrital. E chantageou a ala do DEM favorável à sua expulsão. "Se vocês radicalizarem daí, eu radicalizo daqui", avisou, deixando claro que poderia fazer revelações sobre ilícitos do partido em campanhas eleitorais de outras paragens.

No passado e no presente, as palavras de Arruda retratam um caráter e uma mentalidade. A jura cínica, a confissão oportunista e a ameaça descarada expõem o estofo característico dos políticos sem princípios, que fazem qualquer negócio para salvar a pele quando apanhados ? tardiamente, em geral ?, servindo-se do poder para nele prosperar. A corrupção é como um vício: uma vez experimentados os seus efeitos, a compulsão se alimenta de si própria, não conhece limites, muito menos permite aos viciados enxergar as consequências de seus atos. A sensação que a droga em sentido metafórico proporciona é a mesma da verdadeira: a certeza da onipotência e da incolumidade. A partir do momento em que Arruda aceitou fazer carreira com os mesmos meios que proporcionaram ao chefão político do DF, Joaquim Roriz, três mandatos de governador e um de senador (ao qual também renunciou para não ser cassado), iniciou um caminho sem volta. Tornou-se, porque quis, o seu herdeiro, embora viessem a romper mais tarde. E esse nexo é o que espessou o pantanal de Brasília.

Numa nota que leu anteontem, Arruda se disse livre dessa "herança maldita" do governo anterior. Ele falava do delegado aposentado Durval Barbosa, que Roriz instalara na estatal de informática do DF, a Codeplan. A empresa foi acusada, entre outras coisas, de fazer repasses ilegais para a campanha do governador à reeleição, em 2002. Quatro anos depois, Barbosa foi cuidar das finanças da campanha de Arruda. Em 2007, o novo governador o nomeou secretário de Relações Institucionais. O seu gabinete se transformou numa concorrida agência bancária VIP do governo, onde colaboradores do governador e deputados distritais iam sacar o seu mensalão, enquanto, a partir de certo momento, o pagador os filmava clandestinamente. Primeiro, por conta própria. Depois, para a Polícia Federal (PF), a fim de obter o benefício da delação premiada nos cerca de 30 processos a que responde por suas maracutaias na era Roriz. Arruda o demitiu na semana passada, depois que tudo veio à tona com a Operação Caixa de Pandora, da PF, incluindo as cenas antológicas de dinheiro nas meias do presidente da Câmara e na cueca do dono de um jornal de Brasília.
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