Opinião

Menos pessoas ou mais comida?

Washington Novaes
Qual é hoje a questão central, mais grave, no mundo? A população de 6,8 bilhões, que pode chegar a 9 bilhões em 2050 (ou a 12 bilhões, segundo demógrafos mais pessimistas)? O consumo de recursos e serviços naturais, já quase 30% além da capacidade de reposição do planeta (e que tende a crescer mais)? A fome (mais de 1 bilhão de pessoas) e a pobreza (cerca de 40% da humanidade)?


Há poucos dias, 300 especialistas reunidos em Roma pela Organização para a Alimentação e a Agricultura (FAO), da ONU, discutiram esta questão central: como produzir o suficiente para alimentar toda a atual população global e mais 35% (pelo menos) que a ela se acrescerão nas próximas décadas. Eles entendem que terras suficientes há, desde que se consiga aumentar muito a produtividade por hectare e se invistam US$ 83 bilhões por ano nos países mais pobres, mais de metade dos quais em mecanização e irrigação; hoje, o nível de investimentos nesses lugares está em US$ 23 bilhões por ano. Isso permitiria aumentar a produção no mundo em 70%. Mas também será necessário mudar a legislação sobre propriedade intelectual de sementes de alimentos, que, segundo eles, "ameaça a pesquisa e a biodiversidade", além de favorecer a manutenção de um mercado oligopolizado de alimentos (três empresas dominam 47% do mercado de sementes comerciais no mundo).

Um exemplo dramático pode ser o da África Subsaariana, hoje com cerca de 800 milhões de pessoas, que serão pelo menos 1,5 bilhão em meados do século. Mais de 200 milhões já passam fome. A produtividade agrícola ali, de 1,2 tonelada por hectare, é menos de metade da média nos demais países pobres, de 3 toneladas por hectare. E só 3% das terras são irrigadas; 80% das propriedades rurais têm menos de 2 hectares. Mas a moeda tem outra face: os pobres africanos (como os asiáticos) emitem 0,1 tonelada de dióxido de carbono por ano, enquanto o norte-americano médio emite cerca de 20 toneladas. Sir Nicholas Stern, consultor do governo britânico, diz que no Brasil a emissão média per capita está entre 11 e 12 toneladas anuais. Aqui, diz a Pnad (Boletim do Ipea, 25/9) que uma pessoas que faça parte do segmento mais rico (1% da população) gasta em três dias o que uma pessoa pobre gasta em um ano; e que no ritmo atual serão necessários mais 20 anos "para chegar a um patamar que possa ser considerado justo".

Vale a pena tomar conhecimento de uma discussão sobre esses temas dos limites globais promovida pela revista New Scientist (26/9) com alguns pensadores respeitados. Fred Pearce, da própria revista, acha que o problema não é população, é consumo excessivo. O biólogo Paul Ehrlich, da Universidade da Califórnia, autor de The Population Bomb, pensa que os 2,3 bilhões de pessoas que nascerão até 2050 afetarão o planeta mais que os últimos 2,3 bilhões, já que a maior parte nascerá nos países mais pobres e terá muito mais necessidades a suprir (Uganda, por exemplo, triplicará sua população de 33 milhões). Para enfrentar a questão será preciso reduzir o consumo das pessoas mais ricas e melhorar muito o sistema educacional e de saúde, dar mais oportunidade de trabalho às mulheres.
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