Rotativas

A imprensa embriagada

Biaggio Talento no Observatório da Imprensa
"Quem imagina que o genial diretor Billy Wider desfechou os mais duros golpes cinematográficos contra a imprensa sensacionalista, precisa assistir A Embriaguez do Sucesso, um filme de 1957, do desconhecido Alexander Mackendrick (baseado num conto do jornalista e escritor Ernest Lehman).

Foi lançado em DVD no Brasil, discretamente, sem qualquer publicidade, o que deixaria irado Sidney Falco, o ambicioso e golpista assessor de imprensa da história. Falco (interpretado por Tony Curtis), no entanto, é apenas uma peça na engrenagem do poderoso colunista J.J. Hunsecker (o magistral Burt Lancaster) do não menos poderoso tabloide de Nova Iorque.

Hunsecker é o principal alvo de Lehman, que conheceu os intestinos da imprensa marrom americana no início de carreira. Personagem baseado no colunista Walter Winchell, do tabloide Daily Mirror, Hunsecker se gaba deter 60 milhões de leitores e telespectadores (também apresenta um noticiário televisivo) e ganha a vida, basicamente, publicando notinhas enigmáticas capazes de destruir e reabilitar reputações.

A Winchell (o colunista da vida real) é justamente atribuída a ‘criação’ do estilo de notas curtas, ‘plantadas’, que visam mandar mensagens cifradas (ou não), escondendo sempre algum interesse escuso, geralmente com o objetivo de extorquir dinheiro de alguém. Em A Embriaguez do Sucesso, o imenso poder de J.J. não é suficiente, no entanto, para evitar que sua irmã caçula se apaixone por um jovem músico de bar, rapaz íntegro, honesto e, portanto, sem condições de entrar no clube dos homens de sucesso.

Como separar os dois sem ficar mal com a irmã? Pedindo ajuda a Sidney Falco, que sobrevive prestando assessoria a uma clientela cujo objetivo maior é ter o nome publicado, positivamente, na coluna de Hunsecker.

Escândalos cavados

É na relação do puxa-saco Falco, disposto a vender a mãe se for preciso para cair nas graças de Hunsecker, e a prepotência do colunista, que se arma a trama na qual se produzem diálogos antológicos, como aquele em que, num bar, um senador - que está tendo uma ‘audiência’ com Hunsecker - pergunta a Falco como exatamente um assessor de imprensa trabalha. ‘Um assessor de imprensa come lixo de um colunista e deve chamar de alimento’, responde com seca ironia Falco.

Hunsecker não deixa a bola cair, dividindo a responsabilidade nesse sistema deplorável de toma-lá-dá-cá: ‘Os preguiçosos pagam a você para ver o nome deles em minha coluna’, espicaça. Ao senador acrescenta: ‘E cavam escândalos de pessoas públicas para passar aos colunistas’. Essa dialética da corrupção permeia toda a história e é excelente neste momento em que o Supremo Tribunal Federal decidiu acabar com a obrigatoriedade do diploma de jornalista no Brasil.

Trama oportuna também às vésperas de mais uma campanha presidencial na qual estratégias começam a ser armadas com os Hunseckers da vida, que agora têm à disposição a diabóloca ferramenta da internet.

A Embriaguez do Sucesso não tem o humor caricato de A Primeira Página, nem o exagero do absurdo sensacionalista de A Montanha dos Sete Abutres, os dois filmes de Billy Wider sobre a imprensa, mas segue a mesma linha ao mostrar os exageros às vezes ilimitado do quarto poder. Didático e imperdível para o público em geral, mas principalmente para os jovens que pensam em se tornar jornalistas."

Twitter

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Mosca-dragão

Pegoava?

Jundu