Opinião
Respostas à crise - economia e política
Pedro S. Malan
Apesar de aparências em contrário, há limites para o descolamento prolongado entre os mundos da economia e da política. Afinal, não são rios que correm em leitos distintos, mas braços de um mesmo rio que estão e estarão sempre se reencontrando em seus cursos. Também vimos que havia claros limites ao descolamento da crise financeira dos países desenvolvidos tanto do setor real de suas economias quanto do mundo dos chamados emergentes.
O fato é que a economia é global, embora a política seja domesticamente decidida. E a qualidade e a eficácia das respostas à crise dependem, em boa medida, das interações da resiliência, flexibilidade e capacidade de adaptação de uma economia com a efetividade do funcionamento de suas infraestruturas político-institucionais. Quanto menor o grau de dissonância entre as duas, mais rápida pode ser a superação da crise em determinada economia - se, como parece, a situação global deixar de se deteriorar e começar a dar indícios de gradual melhora a partir de 2010.
É verdade que estamos, há quase dois anos, em meio à pior crise global desde os anos 1930. Que nos atingiu pesado a partir do terceiro trimestre de 2008, como seria inevitável, apesar dos discursos oficiais. Mas não é menos verdade que estamos mais bem situados do que a maioria dos países em desenvolvimento, fora da Ásia, para responder e superar esta crise.
Por quê? Porque temos 15 anos de inflação civilizada desde o lançamento do Plano Real; mais de 15 anos de um Banco Central (BC) com autonomia operacional; mais de 15 anos desde a renegociação da dívida externa do setor público; mais de 15 anos de início do processo de privatizações; mais de 15 anos de maior abertura da economia brasileira ao resto do mundo. Mais de 12 anos desde a resolução de problemas de liquidez e/ou insolvência em nosso sistema bancário; mais de 12 anos desde a reestruturação das dívidas de 25 Estados e 180 municípios com o governo federal. Temos dez anos e meio de um regime de taxas de câmbio flutuante; dez anos de um regime de metas de inflação, mais de nove anos da Lei de Responsabilidade Fiscal, quase nove anos do início do processo de transferências diretas de renda para os mais pobres.
O governo atual soube - ainda que com enormes dificuldades de reconhecê-lo - preservar, ampliar e consolidar o legado que recebeu. Certamente ajudado, em muito, pelo auge do ciclo de expansão da economia mundial no quinquênio 2003-2007, que precedeu e foi uma das causas da crise global. É por tudo isso, e algo mais, que o Brasil é hoje visto como um país mais confiável e mais previsível por investidores nacionais e estrangeiros, o que definitivamente não era o caso 15/20 anos atrás. É por tudo isso, e algo mais, que há hoje entre nós - apesar de tudo - um maior grau de confiança em nosso futuro.
O fato é que somos hoje uma economia de cerca de US$ 1,5 trilhão, do qual o consumo das famílias representa cerca de US$ 1 trilhão (o que é um número relevante em qualquer lugar do mundo), muito embora o consumo do governo seja superior ao investimento total, público e privado, na economia, sendo o investimento federal com recursos orçamentários absolutamente irrisório - pouco mais de 1% do Produto Interno Bruto (PIB).
Mas as estatísticas das contas públicas mostram que, apesar da queda de arrecadação devida à crise (em mais de 5% no primeiro quadrimestre de 2009 sobre igual período de 2008), as despesas totais do governo aumentaram cerca de 19% no período e as despesas com pessoal e encargos sociais aumentaram cerca de 24% na mesma base de comparação. Esses são aumentos permanentes, não reversíveis, portanto, não anticíclicos no sentido adequado da expressão, se respostas fossem a uma crise vista como temporária.
Leio na imprensa que o presidente Lula estará em Genebra, em breve, para conferência internacional, na qual criticaria a "ideologia do Estado mínimo". Desconheço pessoas de expressão política, econômica ou intelectual que, entre nós, façam a defesa de tal fantasma. Mas a ideia serve à militância. Como serviu à insidiosa, leviana e reiterada campanha (à Goebbels) sobre uma suposta intenção, atribuída ao "governo anterior", de privatizar a Petrobrás e o Banco do Brasil. Ou de "acabar com o BNDES", como declarou de forma irresponsável e mentirosa um ex-ministro que serviu ao próprio governo anterior.
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Pedro S. Malan
Apesar de aparências em contrário, há limites para o descolamento prolongado entre os mundos da economia e da política. Afinal, não são rios que correm em leitos distintos, mas braços de um mesmo rio que estão e estarão sempre se reencontrando em seus cursos. Também vimos que havia claros limites ao descolamento da crise financeira dos países desenvolvidos tanto do setor real de suas economias quanto do mundo dos chamados emergentes.
O fato é que a economia é global, embora a política seja domesticamente decidida. E a qualidade e a eficácia das respostas à crise dependem, em boa medida, das interações da resiliência, flexibilidade e capacidade de adaptação de uma economia com a efetividade do funcionamento de suas infraestruturas político-institucionais. Quanto menor o grau de dissonância entre as duas, mais rápida pode ser a superação da crise em determinada economia - se, como parece, a situação global deixar de se deteriorar e começar a dar indícios de gradual melhora a partir de 2010.
É verdade que estamos, há quase dois anos, em meio à pior crise global desde os anos 1930. Que nos atingiu pesado a partir do terceiro trimestre de 2008, como seria inevitável, apesar dos discursos oficiais. Mas não é menos verdade que estamos mais bem situados do que a maioria dos países em desenvolvimento, fora da Ásia, para responder e superar esta crise.
Por quê? Porque temos 15 anos de inflação civilizada desde o lançamento do Plano Real; mais de 15 anos de um Banco Central (BC) com autonomia operacional; mais de 15 anos desde a renegociação da dívida externa do setor público; mais de 15 anos de início do processo de privatizações; mais de 15 anos de maior abertura da economia brasileira ao resto do mundo. Mais de 12 anos desde a resolução de problemas de liquidez e/ou insolvência em nosso sistema bancário; mais de 12 anos desde a reestruturação das dívidas de 25 Estados e 180 municípios com o governo federal. Temos dez anos e meio de um regime de taxas de câmbio flutuante; dez anos de um regime de metas de inflação, mais de nove anos da Lei de Responsabilidade Fiscal, quase nove anos do início do processo de transferências diretas de renda para os mais pobres.
O governo atual soube - ainda que com enormes dificuldades de reconhecê-lo - preservar, ampliar e consolidar o legado que recebeu. Certamente ajudado, em muito, pelo auge do ciclo de expansão da economia mundial no quinquênio 2003-2007, que precedeu e foi uma das causas da crise global. É por tudo isso, e algo mais, que o Brasil é hoje visto como um país mais confiável e mais previsível por investidores nacionais e estrangeiros, o que definitivamente não era o caso 15/20 anos atrás. É por tudo isso, e algo mais, que há hoje entre nós - apesar de tudo - um maior grau de confiança em nosso futuro.
O fato é que somos hoje uma economia de cerca de US$ 1,5 trilhão, do qual o consumo das famílias representa cerca de US$ 1 trilhão (o que é um número relevante em qualquer lugar do mundo), muito embora o consumo do governo seja superior ao investimento total, público e privado, na economia, sendo o investimento federal com recursos orçamentários absolutamente irrisório - pouco mais de 1% do Produto Interno Bruto (PIB).
Mas as estatísticas das contas públicas mostram que, apesar da queda de arrecadação devida à crise (em mais de 5% no primeiro quadrimestre de 2009 sobre igual período de 2008), as despesas totais do governo aumentaram cerca de 19% no período e as despesas com pessoal e encargos sociais aumentaram cerca de 24% na mesma base de comparação. Esses são aumentos permanentes, não reversíveis, portanto, não anticíclicos no sentido adequado da expressão, se respostas fossem a uma crise vista como temporária.
Leio na imprensa que o presidente Lula estará em Genebra, em breve, para conferência internacional, na qual criticaria a "ideologia do Estado mínimo". Desconheço pessoas de expressão política, econômica ou intelectual que, entre nós, façam a defesa de tal fantasma. Mas a ideia serve à militância. Como serviu à insidiosa, leviana e reiterada campanha (à Goebbels) sobre uma suposta intenção, atribuída ao "governo anterior", de privatizar a Petrobrás e o Banco do Brasil. Ou de "acabar com o BNDES", como declarou de forma irresponsável e mentirosa um ex-ministro que serviu ao próprio governo anterior.
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Comentários
Pelo lido, o ministro Malan acredita mesmo que foi um super herói da nação, juntamente com o sociólogo FHC, por ter salvado o país da crise da época. E então o questiono, Sr. Malan, a modo Sócrates, na contradição de seus dizeres: Será que o mundo desenvolvido, no ápice da revolução tecnológica (meados do anos 90) iria realmente deixar que o Brasil, “uma economia de cerca de US$ 1,5 trilhão, do qual o consumo das famílias representa cerca de US$ 1 trilhão”, falisse
Ora povo brasileiro, em uma economia altamente globalizada, foram muito mais beneficiados os politiqueiros tipo Malan, do que Lula. Afinal, Lula surfou na onda positiva da economia mundial. Já FHC, vendeu nossa prancha, financiou uma nova com os americanos e continuou com ela fincada na areia, só pagando de surfista.
PS- Sr Malan, li Smith e não compartilho da sua opinião. No meu entender, Smith nunca deixou clara que as instituições reguladoras seriam dirigidas pelo Estado e acredito que não era essa sua idéia. Afinal, sua fundamentação objetivava muito mais um anarquismo financeiro, do que qualquer participação estatal. Smith, como Marx, certamente, já teriam outras teorias para o mundo moderno.