Opinião

A corrupção na Polícia Civil

Editorial do Estadão
À medida que vão sendo investigadas as denúncias de manipulação de processos disciplinares e de cobrança de propina de delegados em troca da nomeação para a chefia de delegacias de polícia - divulgadas em uma série de reportagens dos repórteres Bruno Tavares e Marcelo Godoy no caderno Metrópole do Estado - vai ficando claro que o tráfico de influência e a corrupção em alguns setores da Secretaria da Segurança Pública de São Paulo são maiores do que se imaginava. As acusações atingem a cúpula da Polícia Civil.

A nova crise na Secretaria da Segurança Pública, que em 2008 enfrentou a maior greve de policiais de sua história, foi deflagrada pela denúncia do investigador Augusto Pena, que em abril do ano passado foi acusado de sequestrar, e exigir R$ 300 mil para não prender, o enteado do principal líder do Primeiro Comando da Capital (PCC), Marco Willians Camacho, o Marcola. Processado pelo Ministério Público, em fevereiro deste ano Pena aceitou a proposta de "delação premiada" que lhe foi oferecida e, em troca de uma punição mais branda, contou como funcionava o esquema de venda de cargos de chefia na Polícia Civil. Ele apontou como mentor do esquema o advogado Lauro Malheiros Neto, indicado para secretário adjunto de Segurança Pública em janeiro de 2007 e demitido em maio de 2008, quando surgiram as primeiras denúncias.

A situação de Malheiros Neto se agravou esta semana, com a entrega de um vídeo ao escritório do Ministério Público em Guarulhos, no qual seu primo e sócio, advogado Celso Valente, negocia privilégios para delegados e investigadores. O vídeo é amador, a qualidade do som é ruim e a gravação parece ter sido editada, mas o conteúdo é estarrecedor. Divulgado com exclusividade pelo Estado, o diálogo travado por Valente com um policial civil mostra que a indicação de um posto no Departamento Estadual de Trânsito (Detran) custava R$ 200 mil e a revisão de punições disciplinares aplicadas em processos administrativos a delegados e investigadores acusados de corrupção custava cerca de R$ 100 mil.

Dois dias depois, com base em nova delação do policial Augusto Pena, os promotores do Grupo de Atuação Especial e Repressão ao Crime (Gaeco), do Ministério Público, receberam cópias de alguns ofícios assinados por Malheiros Neto em 2008. Também divulgadas com exclusividade pelo Estado, as cópias revelam que, em maio daquele ano, contrariando parecer expresso da procuradoria jurídica da Secretaria da Segurança Pública, Malheiros Neto autorizou a reintegração, aos quadros da Polícia Civil, de três investigadores que haviam sido demitidos por terem extorquido ladrões de carga. Quatro meses antes, o próprio Malheiros Neto assinara a demissão desses policiais. A ordem de reintegração foi dada por meio de um despacho de apenas três linhas, sem que novas provas documentais e novos argumentos jurídicos justificassem a revisão do processo administrativo.

Como secretário adjunto de Segurança, Malheiros Neto assinou várias decisões em nome de seu superior hierárquico, Ronaldo Bretas Marzagão. Mas, como as investigações mostraram até agora, o secretário de Segurança Pública não tinha conhecimento das acusações que pesavam contra o seu subordinado. E, assim que recebeu a primeira denúncia contra ele, demitiu-o sumariamente. Além disso, Marzagão, que é oriundo do Ministério Público, abriu cinco inquéritos criminais para investigar a compra de cargos em repartições policiais, acionou a Corregedoria da Polícia Civil e determinou uma revisão de todos os processos administrativos sobre os quais pairam suspeitas de favorecimento de investigadores e delegados corruptos. "Tudo o que é objeto da delação será verificado e serão ouvidas, inclusive, as pessoas que supostamente teriam pago propina", diz Marzagão, depois de se colocar à disposição para depor.
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