Coluna da Segunda-feira

Pobrema ou poblema?

Renato Nunes
- Fulana, você sabe qual é a diferença entre pobrema e poblema?
- Claro que sei Sicrana, pobrema é aquilo que a gente aprende na escola que serve pra fazer conta nas aulas de matemática; poblema é aquilo que a gente sente na cabeça, no coração, no sentimento, poblemas na família, isso daí.

O diálogo acima existiu, foi presenciado por um amigo que me relatou assombrado e divertido. Os entendidos tolerantes dirão que se trata de um flagrante explícito da cultura popular espontânea, que vai criando suas próprias formas de expressão e que se incorporam à linguagem corrente. Os intolerantes farão pesada crítica à falência da educação brasileira, má formação dos professores, deficiências da rede de ensino e tantas coisas mais.

Mas, acima de tudo é evidente que para o povão não existe problema, comunicam-se como podem e, dessa forma se entendem. São infinitas as expressões populares inexistentes no dicionário, nascidas da necessidade elementar de encontrar explicações claras e simples para fatos e emoções. Podemos dizer que estão erradas?

Que tipo de crítica razoável podemos fazer àquele diálogo se sabemos que nem sempre a verborragia acadêmica ajuda na troca de idéias nos complicados dias de hoje?

Atualmente estamos assistindo os incríveis esforços dos professores, escritores e redatores dos jornais para explicarem e se adaptarem às reformas ortográficas recentemente implantadas por lei. Porque palavras consagradas estão perdendo acentos e sendo alteradas suas grafias?

Há alguns anos os países de língua portuguesa resolveram unificar a escrita. Foram anos de negociação entre os acadêmicos para se chegar ao atual acordo. Fora outras possíveis explicações que desconheço, portugueses, africanos e brasileiros devem agora se submeter a uma escrita única nascida da necessidade de padronizar programas de computador e textos de comunicação entre os povos desses países.

Ou seja, por esse acordo as razões da informatização e globalização passarão a determinar o que está certo ou errado nas formas escritas nascidas entre povos de culturas diferentes. A espontaneidade criadora e renovadora de suas culturas estará agora prisioneira de uma regra entre nações, que coloca os interesses de ordem pragmática acima das invenções sensíveis da população.

Daqui para frente, se quisermos incorporar à nossa escrita expressões populares nascidas no Brasil teremos que consultar os sábios de Portugal e da África. E vice versa.

Essa lei, mais do que unificar a escrita está pasteurizando culturas. Acho isso sem graça.
Prefiro o espontâneo de cada povo.

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