Coluna da Segunda-feira

A farra do boi

Êêêê, vida de gado,
Povo marcado e povo feliz.

Zé Ramalho, músico e poeta popular


Renato Nunes
O nosso Brasil é um país curioso. Tão cheio de belezas, alegria, folclore, cores, músicas, tudo isso produzido por uma mistura de raças, culturas, índios, europeus, asiáticos, árabes e muita gente mais. Se fossemos relacionar encheríamos páginas, ou faríamos um livro grosso como os de Gilberto Freire ou Darcy Ribeiro, só para citar os mais conhecidos que tentaram compreender e descrever a identidade do povo brasileiro. Com freqüência surgem características novas indicando que a formatação procurada ainda não está concluída.


Creio que nenhum deles poderia imaginar tantas qualidades produzindo tantas maldades, tantas falcatruas. O Brasil de hoje parece uma feijoada que ainda não está pronta, ainda temos que esperar no mínimo meio século para que tudo fique cozido por igual, sem o gosto predominante de nenhum dos ingredientes, até que seja fixado um novo gosto, único, resultante do intercâmbio de tão diferentes paladares.

Porquê tanta maracutaia acompanhada com tanta indiferença pela população? Rimos de tudo, assistimos pela TV programas de humor baseados nas pilantrices das autoridades e fica tudo por isso mesmo. Juizes são presos, presidente de Tribunal de Justiça é preso junto com desembargadores e respeitáveis membros do Poder Judiciário. Policiais, delegados, autoridades e outras peças fundamentais criadas pela Constituição para garantir a normalidade da vida democrática da nação e a defesa de valores éticos, importantes para o futuro das próximas gerações, estão comprometidas com os desvios e assalto às finanças públicas diariamente exibidos nos jornais, e fica tudo por isso mesmo.

O presidente Lula quando foi deputado não quis se recandidatar a novo mandato na Câmara Federal. Indagado sobre a recusa usou uma frase que ficou famosa: “...no Congresso tem mais de trezentos picaretas!” Mais tarde, já eleito Presidente da República, tem usado as picaretas do Congresso para abrir as estradas de seu programa de governo. Decisão arriscada porque não se abrem boas estradas com picaretas ruins.

E vamos nós, convivendo pacífica e ordeiramente com os desmandos oficiais, e ainda iremos, com orgulho cívico, reelegê-los. E querem mais. Porquê aumentar o número de vereadores? Será que as Câmaras Municipais para cumprirem melhor seu papel precisam de mais vereadores? O problema será de quantidade, ou será de qualidade? Porquê será que o Congresso Nacional não se propõe a discutir amplamente a questão eleitoral, decidindo por plebiscito se o voto deve ser obrigatório ou livre, espontâneo e consciente. Sabe-se que voto obrigatório é mercadoria de baixo valor, fácil de ser comprado e está na origem do baixo nível dos legislativos por esse Brasil a fora. Porquê não fazer ao menos uma experiência para ver que padrão sai das urnas?

A briga entre o Senado e a Câmara sobre o aumento dos vereadores é de mentirinha. O líder do PT na Câmara Federal, um deputado por Pernambuco, cinicamente defendeu na TV que os mais de sete mil vereadores não custarão nada aos governos municipais, serão pagos com verbas já existentes. Ora, se as verbas estão assim disponíveis, deixem que os municípios as usem para outros fins, as carências são infinitas.

A lógica da rede de dependências políticas que gera pedidos de verba aos ilustres senhores deputados está na base de toda essa artimanha. Com o passar do tempo desenvolve-se no Brasil a convicção que tudo tem que ser solicitado aos poderosos e às autoridades e não à lei.

Sendo assim, é importante não se indispor com ninguém, você pode vir a precisar de algum empurrão ou pelo menos que não o atrapalhem, já que a lei é mansa, frágil, lenta, manipulável, igual as molduras dos quadros. São só o enfeite. O quadro pode ser péssimo, mas se a moldura for dourada e rebuscada estará enfeitando o salão principal de algum palácio.

Acho que esse é o risco que corremos. Os tempos atuais estão colocando um novo tempero na feijoada da formatação do caráter nacional. Nem o Gilberto Freire nem o Darcy Ribeiro poderiam sonhar com o que vem por aí na identidade de seu amado povo brasileiro.

Comentários

Anônimo disse…
Caro Prof. Renato Nunes,

Li com muita atenção a sua coluna desta 2ª. feira. Captei a sua mensagem...e tbm estou indignado com a "farra do boi", q habitualmente os poderes constituídos nos pregam de sopetão. Ora, os nossos Senadores da República...q papelão! querendo forçar a barra para promulgar uma PEC, (só para agradar os lobistas da União de Vereadores e outros candidatos suplentes), arranhou a Constituição Federal, ao pretender retroagir os efeitos da EC ao pleito eleitoral de 2008 já consumado e exaurido. Seria "aberratio monstrengo" se a Câmara Federal a promulgasse, da forma como pretendia valer-se. Apostei um jantar com alguns companheiros...q a EC não vingaria... só q todos fugiram da raia. Desnecessário dizer q não sou fã de "puxasaquismo", mas estou contigo e sei q vc é um crânio. Aqui em Ubatuba, ninguém...eu disse ninguém tem mais autoridade do que vc para falar sobre projetos de Uso e Ocupação do Solo do nosso município.
Anônimo disse…
Caro Prof. Renato Nunes,

Li com muita atenção a sua coluna desta 2ª. feira. Captei a sua mensagem...e tbm estou indignado com a "farra do boi", q habitualmente os poderes constituídos nos pregam de sopetão. Ora, os nossos Senadores da República...q papelão! querendo forçar a barra para promulgar uma PEC, (só para agradar os lobistas da União de Vereadores e outros candidatos suplentes), arranhou a Constituição Federal, ao pretender retroagir os efeitos da EC ao pleito eleitoral de 2008 já consumado e exaurido. Seria "aberratio monstrengo" se a Câmara Federal a promulgasse, da forma como pretendia valer-se. Apostei um jantar com alguns companheiros...q a EC não vingaria... só q todos fugiram da raia. Desnecessário dizer q não sou fã de "puxasaquismo", mas estou contigo e sei q vc é um crânio. Aqui em Ubatuba, ninguém...eu disse ninguém tem mais autoridade do que vc para falar sobre projetos de Uso e Ocupação do Solo do nosso município.

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