Opinião

O calote do Equador

Editorial do Estadão
O presidente Rafael Correa, do Equador, padece de uma forma particularmente virulenta da doença infantil do populismo - aquela que leva seu portador a considerar ilegais e ilegítimos todos os empréstimos tomados por seu país, nos tempos em que ele ainda não havia assumido o poder para redimir o seu rebanho. No Brasil, durante mais de duas décadas, o PT e alguns partidos de esquerda pregaram o calote, a pretexto de sanear finanças viciadas e moralizar costumes degradados pela dívida externa. Felizmente, quando o PT chegou ao poder pelas mãos do presidente Lula, prevaleceu o bom senso deste e o assunto foi prudentemente esquecido.

Com o presidente Rafael Correa foi diferente. Candidato, ele satanizou a forma como o Equador se endividou. Presidente, constituiu uma comissão para auditar a dívida externa, contraída entre 1976 e 2006, tomando o cuidado de escolher pessoas politicamente comprometidas para examinar uma questão eminentemente técnica, dos pontos de vista financeiro e jurídico. O resultado, como não poderia deixar de ser, foi que a comissão descobriu ter havido uma imensa conspiração entre organismos multilaterais, bancos com atuação internacional e autoridades equatorianas - de todos os governos, destes últimos 30 anos - para afogar o país numa dívida que hoje chega a US$ 10 bilhões.

De posse do relatório da comissão, Rafael Correa mandou formar uma rede de rádio e televisão e anunciou, primeiro, uma moratória técnica de 30 dias, suspendendo o pagamento dos juros dos bônus Global 2012, no valor de US$ 30,6 milhões, enquanto decide que medidas legais tomará em relação ao restante da dívida. A ameaça é estender a moratória a toda a dívida. Em segundo lugar, anunciou que estava recorrendo à Corte de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional para não pagar um empréstimo de US$ 286,8 milhões contraído pela estatal equatoriana de energia com o BNDES para que a Odebrecht pudesse construir a Hidrelétrica de San Francisco.

Já afirmamos nesta página que, ao expulsar a Odebrecht e Furnas do Equador, ameaçando, ao mesmo tempo, não pagar o BNDES, Rafael Correa queria fazer o melhor negócio do mundo: ficar com a usina - que, depois de feitos os consertos necessários, funciona a plena carga - sem pagar o saldo do financiamento, que não é pequeno. Na verdade, ele quer mais. Pretende dar o calote em todos os credores do Equador. E, assim como pouco se abalou com a reação do governo brasileiro, que tardou, mas veio na forma da chamada a Brasília do seu embaixador em Quito, não teme a reação da comunidade financeira internacional, pois, como altos funcionários equatorianos disseram, a Venezuela do caudilho Hugo Chávez está aí, para fornecer os dólares que os bancos internacionais deixarão de enviar ao país.
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