Coluna de Domingo

Educação, carinho e trabalho

Rui Grilo
Durante muitos anos, Fernando Henrique manteve um grupo de discussão sobre “O CAPITAL”, a principal obra de Marx. Talvez a maior contribuição de Marx seja a elaboração da dialética, um método muito eficiente para a interpretação de fatos e acontecimentos sócio-históricos. Por isso, a necessidade de ser estudado e apreendido por quem trabalha em qualquer atividade da área das relações humanas. Causa espanto o fato de Eunice Durham, uma antropóloga, se surpreender com o uso desse conceito nos cursos de pedagogia.

Ela também afirma em entrevista à Veja, que a Pedagogia “está prejudicada pela ideologia e pelo excesso de críticas vazias “ e que a “ bibliografia adotada nesses cursos, {está} circunscrita a autores da esquerda pedagógica. Eles confundem pensamento crítico com falar mal do governo ou do capitalismo. Não passam de manuais com uma visão simplificada, e por vezes preconceituosa, do mundo.”

Muitas vezes não nos damos conta que ainda não atingimos a meta de estender o direito à educação para todos e que, no Brasil, essa ampliação se deu de maneira mais significativa a partir da década de 60. Mas o grande marco dessa luta foi a Revolução Francesa, quando a burguesia se aliou ao povo para lutar contra a aristocracia e o clero que detinham esse privilégio. Nas assembléias, o grupo que representava os interesses do povo se sentava à esquerda, daí o fato de se chamar de esquerda, as pessoas que defendem as prioridades sociais em contraposição à propriedade privada e aos direitos individuais.

Então, quando se luta pela democratização de educação, nada mais lógico que se recorrer a uma bibliografia de esquerda.

Quando questionada sobre o papel dos sindicatos, Durham afirma:

”Está suficientemente claro que a ação fundamental desses movimentos é garantir direitos corporativos, e não o bom ensino. Entenda-se por isso: lutar por greves, aumentos de salário e faltas ao trabalho sem nenhuma espécie de punição.”


Qualquer pessoa minimamente esclarecida sabe que os sindicatos tiveram e ainda têm um papel fundamental na luta pelos direitos humanos e contra a escravização do ser humano pelo capital. Os iluministas acreditavam que o saber e a ciência iriam trazer um mundo de felicidade e que iria libertar o homem dos grilhões da escravidão. Já há condições para que ninguém morra de fome ou por doenças como a tuberculose e a diarréia. No entanto, se gasta mais para matar do que para salvar vidas. Cada vez mais a luta sindical se torna uma luta contra os sistemas políticos que concentram riquezas nas mãos de uma elite que se enriquece à custa da maioria da população.

Como a ciência não é neutra e depende de quem financia e divulga as pesquisas e o conhecimento, os sindicatos, cada vez mais têm que promover suas próprias pesquisas, cursos de atualização e aperfeiçoamento de novas habilidades, para garantir àqueles que perdem seus empregos, uma recolocação profissional. No caso do magistério, grande parte da qualificação de seus profissionais é feita pelos próprios sindicatos, ou exigindo em negociações com os empregadores que seja um direito assegurado.

Um exemplo dessa preocupação é a pesquisa organizada por Wanderley Codo, da Universidade de Brasília, patrocinada pela CNTE – Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação - publicada com o título de “EDUCAÇÃO – CARINHO E TRABALHO”.

Primeiro estudo intensivo de saúde mental e trabalho de uma categoria profissional no Brasil - os professores; tanto por abranger o país em todos os seus Estados quanto por enfocar, desde os determinantes macroeconômicos até os conflitos mais subjetivos de cada sujeito.

Não é um livro sobre educação, mas sobre o trabalho dos educadores das redes públicas dos Estados - cerca de 1.800.000, em 1999. Esse estudo apontou que “Um a cada quatro educadores sofre de exaustão emocional, mas 90% dos trabalhadores em educação estão muito satisfeitos, a grande maioria muito comprometida com seu trabalho.”

Daí o grande número de licenças e faltas ao trabalho referidos no texto de Durham. É necessário ir às causas dessa situação.

De 1999 para cá, a situação piorou muito, como ficou evidente no episódio da depredação da Escola Estadual Amadeu Amaral, uma escola cujo prédio está em melhores condições do que muitas escolas e em uma região servida por infra-estrutura urbana muito superior à grande maioria das escolas da periferia.
Rui Grilo
ragrilo@terra.com.br

Comentários

Anônimo disse…
Parabéns!!! Pena que em uma sociedade tacanha como a nossa, "O Capital" é apenas para nós comunistas (hoje ou em algum tempo). Para os demais o mesmo é quase um pecado. Por culpa de Stalin e outros malucos embebidos pelo poder o Socialismo virou sinônimo de atrocidades e excessos. Precisamos de jovens questionadores. Nossos educadores devem sim estimular uma atitude esquerdista em nossas crianças. Questionar é parte do processo de aprendizagem. Não podemos admitir uma geração de acomodados, sem cultura e estimulados a consumir o que de pior a humanidade foi capaz de produzir.

Postagens mais visitadas deste blog

Mosca-dragão

Pegoava?

Jundu