Coluna da Terça-feira

Romaria a pé de Ubatuba à Aparecida: Uma grande lição de vida

Maurício Moromizato
Em Ubatuba há um grupo organizado de católicos que realizou sua oitava “Romaria a pé a Aparecida do Norte”.
Romaria pode ser definida como viagem ou peregrinação a algum local religioso ou de devoção, centro de peregrinações cristãs. Segundo
Câmara Cascudo, a tradição da romaria foi trazida para o Brasil pelos portugueses. Quando a pé, os romeiros se intitulam caminheiros e seguem sós, em duplas, ou em grupos. Há caminheiros que se organizam em grupos que peregrinam regularmente, alguns com décadas de caminhadas.
Na semana que passou, participei, pela terceira vez desse grande evento religioso. Uma experiência de fé que dá lições de vida por todo seu caminho.
A romaria possui três fases: a viagem, a chegada e o retorno do romeiro.
Nossa viagem se inicia na Quarta-feira, com missa celebrada na Igreja Matriz de Ubatuba, às onze horas da noite. Esse ano, o celebrante foi nosso Frei Avelar, que com seu carisma deu um ânimo extra a todos e um exemplo de superação ao nos acompanhar por toda a primeira etapa, que vai da Matriz ao Alto da Serra do Mar, nos primeiros quinze quilômetros. Seguramente os que mais exigem do físico de todos os romeiros. Nesse primeiro trecho, a dificuldade atinge a todos de maneira única e diferente, mas já dá a todos um nivelamento e uma igualdade dentro da individualidade: desaparece a vaidade e durante e após a chegada ao alto da serra, ninguém mais se preocupa com aparência física, com o estado das roupas e calçados. Todos, indistintamente, sentam-se e deitam-se aonde for possível e ao lado de quem quer que seja. Entra em campo a Fraternidade, a Solidariedade e a alegria de ver e torcer pela Superação de todos e de cada um ao obstáculo físico e psicológico que representa a subida da serra. Após a chegada de todos, há uma oração e uma bênção para a cidade de Ubatuba. O primeiro dia de caminhada segue entrando pelo núcleo de Santa Virgínia, por estradas vicinais até o distrito de Catuçaba com paradas para o café da manhã e o almoço. Em Catuçaba, formação natural de grupos para se hospedar em casas alugadas e alojamentos para o repouso merecido, missa com toda a romaria e jantar comunitário.
O segundo dia é o mais tranqüilo, com um trecho de “apenas” vinte e seis quilômetros a ser percorrido, entre Catuçaba e a cidade de Lagoinha, iniciado na metade da manhã. Almoço comunitário em uma fazenda e a chegada no final da tarde. Apesar da aparente facilidade do dia, o cansaço já se apresenta e é preciso exercitar a Paciência e combater a Ansiedade para manter o grupo unido e coeso, tarefa difícil, mas alcançada com sucesso. Em Lagoinha, missa à noite, jantar no alojamento ou em restaurantes da cidade e uma noite de sono para acumular forças para o último e mais longo dia. Hora da Sabedoria de repousar no horário apesar da vontade de festejar com os amigos caminhantes.
O terceiro e último dia de caminhada inicia-se de madrugada, percorrendo mais de quarenta quilômetros entre Lagoinha e Aparecida, com a subida pesada e a descida perigosa no morro do Bonfim. A lama foi uma dificuldade extra durante todo esse percurso, principalmente no último obstáculo, que é a subida do morro do “Deus me livre”. Até esse momento, a vaidade já caiu por terra. A Fraternidade, a Solidariedade, a Superação, a Paciência e a necessidade de espírito de grupo já foram exercitadas e mostraram sua importância. A Ansiedade aparece e é superada. Todos estão mais Sábios, mais conhecedores de si e dos outros.
Vem então a segunda fase da viagem, a chegada ao objetivo. Após três dias exaustivos, de pouco sono, muito cansaço, dores, fome e sede, tem fim a provação. O sentimento de Alegria e de Felicidade toma conta. A espiritualidade é contagiante ao chegar, receber e ser recebido por cada um dos companheiros de jornada. A Visão da Basílica do alto do morro é inesquecível. Faz parte dessa chegada também a missa, realizada no Domingo, com presença de todos os romeiros, na Basílica cheia, interagindo com fiéis de todo o Brasil.
Missão cumprida, no retorno para casa a certeza de que valeu a pena. A cada Romaria (é minha terceira), volto diferente, novo e renovado. Mais feliz, uma pessoa melhor, com certeza. E com a certeza de que cada um dos participantes contribuiu para esse sentimento. Novos amigos e companheiros, antigas amizades reforçadas. É hora da Gratidão. Gratidão a todos os companheiros de viagem. Aos organizadores que nos proporcionam essa incrível experiência. Aos que estão lá “trabalhando”, como os motoristas, cozinheiras e apoiadores, tão romeiros quanto nós. Aos que ficaram na retaguarda, função mais difícil, pela qual passei no ano passado, e que garantem a integridade e a segurança do grupo. Aos que ficaram, família e amigos, solidários e esperando pelo nosso retorno. Aos que nos receberam em cada uma das paradas e por toda a peregrinação.
Estou lendo uma trilogia intitulada “virtudes para um outro mundo possível”, de Leonardo Boff. É dividida em “hospitalidade: direito e dever de todos”, “convivência, respeito e tolerância” e “comer e beber juntos e viver em Paz”. Nesse tempo que vivemos hoje, com a humanidade globalizada e em crise de valores, a Romaria deixa a lição final de que é possível esse outro mundo, pois as virtudes citadas acima são exercitadas e se mostram possíveis em todo o seu percurso e consistem no nosso desafio ao retornar a nossa vida cotidiana.
A espiritualidade precisa fazer parte da vida de todos, e todas as religiões devem ser respeitadas. Os valores verdadeiros precisam prevalecer na nossa vida particular, familiar, profissional, social e política.
Finalizo com duas convicções que trago hoje comigo. Ano que vem estarei novamente presente e um sentimento que resume toda a romaria, deve governar nossas vidas e desejo a todos, indistintamente: o AMOR.
Um grande e fraterno abraço a todos os amigos ROMEIROS DE UBATUBA. Nossa missão agora é manter e propagar o espírito da Romaria em nossa vida cotidiana.
Maurício Moromizato

Comentários

Anônimo disse…
Gostaria de saber quando acontece esta Romaria e como eh que se faz para fazer inscrição?

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