Opinião

Todo dia é Dia da Hipocrisia

Luiz Weis
O presidente Lula, criticando os críticos da propaganda de Marta Suplicy, que perguntou se o prefeito Gilberto Kassab é casado e tem filhos, disse que ainda vai criar no Brasil o Dia da Hipocrisia. São hipócritas, argumentou, os que acusaram a candidata de explorar o preconceito contra os homossexuais - embutido naquelas perguntas, que se tornaram o acontecimento singular mais falado da campanha deste ano. Ou porque, sugeriu Lula, os acusadores fingem ignorar que a candidata tem um histórico reconhecido de combate ao preconceito, ou porque ela própria foi vítima disso ("dona Marta", a que trocou o marido, um santo homem, por um argentino), ou ainda porque eles próprios estão entre os incuráveis portadores do preconceito antimartista.


Debater generalidades é como ler jornal numa ventania, uma exasperante perda de tempo. Mas um ponto não pode passar batido das palavras do presidente. É a conclusão implícita de que, pelo que fez, pelo que passou e por serem o que são, presumivelmente, os que lhe apontam o dedo, Marta tem direito à imunidade quando apela para o feio sentimento da homofobia, compartilhado por sabe-se lá quantos eleitores paulistanos. É irrelevante a esta altura especular se Marta autorizou ou foi surpreendida pela baixaria, como todo mundo. Candidatos têm responsabilidade objetiva pelo que os seus propagandistas levam ao ar. É irrelevante também querer dividir ao meio um fio de cabelo, contestando a alegação de que a intenção não era difamar o adversário, mas chamar a atenção para as suas zonas de sombra: em política, o que parece é.

A rigor, Lula expressou uma idéia conveniente que surge a toda hora em inumeráveis circunstâncias. É a da alegada superioridade moral das vítimas sobre os seus algozes, o que impediria até mesmo se admitir que possam ter agido como eles e condená-las por isso. Nesse sofisma, é simplesmente inconcebível, por definição, que alguém alvo de preconceitos notórios e duradouros descesse ao nível dos que os dispararam, imitando-os por um motivo ou outro. Escudados nessa ficção, Marta e o responsável pela sua propaganda, o publicitário João Santana, não viram nada de mais em dizer que a sua única falta foi a de não ter antecipado a "celeuma" que se formaria na esteira das perguntas inflamatórias. Parafraseando a citação famosa, não foi um crime, só um erro.
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