Opinião

O Judiciário desce do Olimpo

Gaudêncio Torquato
O Judiciário brasileiro vive dias de glórias. Desce do Olimpo para habitar o mundo dos mortais. Até parece que pediu licença às divindades para passar um tempinho conversando ao pé do ouvido com os terráqueos, Joões, Marias e Josés que perambulam pelas ruas, engrossam as filas de ambulatórios e acorrem aos corredores das repartições públicas. E a conversa, podem ter certeza, é recheada de boas notícias. Crianças menores de 5 anos, de Blumenau (SC) e de Santo André (SP), terão direito a creche e pré-escola. Essa decisão, que se poderá estender a todo o território nacional, partiu do Tribunal de Justiça de Santa Catarina e do Superior Tribunal de Justiça, em resposta a ações interpostas pelo Ministério Público Estadual. Aqui, ali e lá em cima, na Corte Suprema, as decisões de juízes começam a se banhar nas águas que jorram das fontes populares. O Judiciário brasileiro, até que enfim, dá sinais de que uma das máximas da romana Lei das 12 Tábuas (451 a.C.) ainda inspira o espírito público dos juízes: salus populi suprema lex (a salvação do povo é a suprema lei).

A referência ao escopo que impregnou o Direito Romano não significa que o nosso Judiciário deva sempre contemplar o passado. Ao contrário. Hoje, uma leitura daquele arrazoado deixa transparecer aberrações como morte à "criança monstruosa"; morte ao devedor, que deve ser cortado em pedaços na hipótese da existência de vários credores; pena capital para autores de injúrias e ultrajes públicos difamatórios; ou mesmo punição a mulheres que "arranhem o rosto e soltem gritos imoderados". O que se pretende dizer é que, na longa história das leis, muitas caducam e algumas vingam. E uma das tarefas mais dignificantes aos corpos que administram a justiça é descobrir qual estatuto legal de alguma época da humanidade ou de qualquer país reúne condições para ser aplicado. Pois bem, o Judiciário brasileiro atravessa um ciclo auspicioso, por incorporar um papel político - no sentido aristotélico, que é o de servir ao bem comum - tão reclamado pela sociedade. Basta lembrar a agenda de impacto sob a égide da Suprema Corte, envolvendo questões como a interrupção de gestação em caso de anencéfalos, a demarcação de terras indígenas, as cotas raciais em universidades, o casamento homossexual, a lei seca e a Lei de Imprensa.
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