Opinião

Cantar sobre o ovo bom e esconder o gorado

José Nêumanne
O carisma do presidente Luiz Inácio Lula da Silva - ou seu teflon, ou sua blindagem, seja lá o que for - desafia até o senso comum e a sabedoria dos mais velhos. Minha avó paterna, Nanita Germano, dizia duas coisas que a experiência de sua longevidade confirmara e reconfirmara, mas o presidente tem desmentido nestes cinco anos de gestão. A velha sertaneja jurava que "em boca fechada não entra mosquito" e também que "quem fala muito dá bom dia a cavalo". Um contemporâneo e como ela natural da aprazível cidade serrana de Luís Gomes, na serra do mesmo nome, no Rio Grande do Norte, o comerciante Gaudêncio Torquato, pai do colega homônimo desta página, ensinava a quem se dispusesse a ouvir a ancestral filosofia dos mascates: "Quem quer vender ouve o freguês e diz amém."

Egresso de outra região serrana de clima frio no meio do sertão, a de Garanhuns, em Pernambuco, Sua Excelência, contudo, pisoteia essas tiradas de lucidez e sabedoria popular com a mesma freqüência com que despreza os cânones gramaticais. Na semana anterior à folga nacional generalizada decretada por Momo, o chefe do governo driblou a coerência (a "virtude dos imbecis", segundo Chatô, outro "rei do Brasil"), jogou a lógica aristotélica para escanteio e mandou às favas o óbvio ululante, sem, contudo, pôr em risco o apoio da galera nas arquibancadas fiéis.
Lula passou cinco anos comemorando as constatações periódicas feitas pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) de que a devastação da Amazônia estava sendo detida. Tratava-se de um sofisma simplório: clareiras abertas na floresta para pastagens ou por motosserras continuavam devorando a mata virgem, mas a um ritmo mais lento, como "nunca antes na história deste país". Com o mesmo ímpeto com que soltava fogos de artifício às boas notícias, contudo, ele vituperou contra a fonte delas quando esta constatou o oposto. Fiel à máxima pragmática que derrubou o sério diplomata Rubens Ricupero do Ministério da Fazenda do governo-tampão de Itamar Franco, de que governos alardeiam boas notícias e tentam esconder as ruins, o presidente cantou sobre o ovo que parecia bom, mas tratou de esconder no borralho o que gorou.
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