Pensata

Controle do governo sobre a população perde força nos quatro cantos do planeta

Samuel R. Berger
Manifestações em massa em Mianmar no último outono. Rejeição das propostas de reforma do presidente Hugo Chávez à constituição venezuelana. Protestos violentos após a eleição presidencial suspeita no Quênia. Confrontos pelo assassinato de Benazir Bhutto, no Paquistão.
Três continentes diferentes, quatro países diferentes, quatro circunstâncias totalmente diferentes. Ainda assim, esses incidentes díspares compartilham um tema: os limites da habilidade até de um governo forte de controlar a revolta pública.
A inquietação em Mianmar começou em resposta à suspensão dos subsídios de combustíveis em agosto. Mianmar é um país rico em recursos, mas seu governo militar controla a riqueza da nação enquanto a maior parte do público vive na pobreza. O regime ficou tão abalado com os protestos pacíficos de dezenas de milhares de monges e civis que lançou uma forte ofensiva -prendendo milhares, matando dezenas e isolando-se ainda mais.
Na Venezuela, Chávez tentou fazer emendas à constituição para consolidar o próprio poder. Apesar de sua popularidade e seus esforços para intimidar a oposição, os venezuelanos não quiseram entregar as rédeas de sua democracia. Agora, Chávez foi obrigado a abreviar sua visão de "socialismo do século 21" e focar-se, em vez disso, em objetivos mais práticos como conter a inflação e a corrupção.
O presidente Pervez Musharraf nunca priorizou investimentos na sociedade civil paquistanesa -preferiu usar os benefícios da ajuda americana para reformar as forças armadas, reprimir a imprensa e o judiciário e combater a dissensão. A podridão do sistema o atingiu antes mesmo do assassinato de Bhutto, mas agora fugiu de seu controle. Musharraf pode vir a ser removido do cargo se não abordar essas preocupações.

E no Quênia, a convicção que as eleições foram fraudadas serviu de fagulha que acendeu um fogo de ira étnica contra os kikuyus, que controlaram a política queniana desde 1963, apesar de serem apenas 22% da população. Centenas de quenianos foram mortos na violência que se seguiu, dezenas de milhares foram desalojados e a fama do Quênia de ser uma história de sucesso na África foi fortemente abalada.
As outras nações, vendo esses eventos de longe, talvez os vejam como incidentes isolados, desconectados um do outro e do mundo mais amplo. Mas os dramas desses quatro países detêm lições para todos nós. Eles nos lembram que o apoio popular a um líder não é o mesmo que legitimidade popular; que mesmo na sociedade mais oprimida, o povo tem um limite quando atura os abusos do governo; que quando essa avalanche de fúria é liberada, é difícil controlá-la; e que regimes autocráticos podem parecer fortes por fora, mas são frágeis diante da inquietação. Como costumava dizer o presidente Bill Clinton: um aperto forte é sinal de mão fraca.
A estabilidade duradoura não pode ser imposta. Só pode ser alcançada pela democracia. E uma democracia saudável exige muito mais que eleições livres ou um líder duro. O que é necessário é respeito ao Estado de direito e instituições sólidas -inclusive mídia livre, judiciário independente, organizações da sociedade civil vibrantes, legislativo profissional e canais legítimos para oposição e dissensão -para que as pessoas tenham meios de expressar frustrações e de responsabilizar seus líderes.
Tome a Rússia, por exemplo. O presidente Vladimir Putin tem popularidade invejável, presidindo em tempos de crescente prosperidade e devolvendo o orgulho nacional russo. Ainda assim, ao longo do caminho, amordaçou a mídia, enfraqueceu e autonomia parlamentar, neutralizou a oposição e reprimiu organizações não governamentais -e, como argumentaram Micahel McFaul e Kathryn Stoner-Weiss, "em termos de segurança pública, saúde, corrupção e a segurança de direitos de propriedade, os russos hoje estão em pior situação do que estavam há uma década."

E se os preços do petróleo caírem, ou a economia russa parar? Quais serão as perspectivas de estabilidade na Rússia então?
A China, enquanto isso, apreciou um crescimento econômico de quase 10% nas três últimas décadas. Ainda assim, houve 87.000 incidentes de desordem pública em 2006 -um reflexo da incapacidade da liberdade política de acompanhar o ritmo da liberalização econômica. Quanto tempo a China pode negar a seu povo o direito de controlar seu próprio destino? Os governantes da China vão estar à frente do descontentamento em cascata?
As instituições democráticas ajudam a ancorar uma sociedade saudável, operante, estável, como árvores que ajudam a prender o solo das encostas e impedem-no de escorregar para o caos. Instituições sólidas são um abrigo contra a tempestade de eventos imprevisíveis -como uma crise econômica, um desastre natural ou um escândalo político- e o investimento mais inteligente que os EUA podem fazer é apoiar, no exterior, sociedades pacíficas, estáveis e abertas.
Como árvores, entretanto, as instituições democráticas levam tempo para se nutrir e crescer. Como diz o ditado, a melhor hora de plantar uma árvore é 20 anos atrás; a segunda melhor hora é hoje. (Herald Tribune)

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