Ponto de vista

Festa da Tainha

Não tenho tido muito tempo para escrever. Mas às vezes há situações que me movem a ligar o computador, abrir as páginas virtuais das revistas eletrônicas (UbaWeb, Ubatuba Víbora, Litoral Virtual) para ler as matérias de nossa região. Depois de muito fingir que esse assunto não me importunava, resolvi ceder à pressão da consciência e escrever sobre a vaidade humana.
Segundo o honesto Houaiss, a etimologia da palavra é latina. Vaidade vem de vanitatis, que quer dizer vacuidade, futilidade, orgulho vão. Uma grande pista.
Cada vez me convenço mais de que os grandes problemas da humanidade são causados por essa característica inata do ser humano. Querer ser sempre mais. Isso explica desde o garotinho que se acha o centro do mundo, ignorando pai e mãe, até o espetáculo grotesco de Eduardo César et caterva, que orfanou muita gente politicamente. Com isso, levanto a tese de que todos nós temos nossa cota de vaidade. Há graus de vaidade que vão desde sua quase ausência até sua presença ostensiva, indo da humildade à arrogância.
Qualquer coisa na vida pode ser remédio ou veneno. Depende sempre da dosagem e do paciente. Tudo tem seu lado bom e seu lado ruim. Até o inferno é bom para que possamos valorizar o Céu. Sem o grão-tinhoso, o que seria dos padres e pastores? Então, vou primeiro falar sobre o lado bom da vaidade.
O grau zero da vaidade é o altruísmo e a humildade. Nada melhor do que conviver com alguém que é verdadeiramente altruísta e humilde. Alguém que se percebe como parte de um todo social e que, como parte desse todo, faz sem muito fuzuê o que tem que ser feito sem se preocupar com as alterações que sua ação poderá trazer para si. Pelo menos como preocupação primeira, já que se esvaziar totalmente das conseqüências também ou é leseira baré ou é um desprendimento de São Francisco de Assis. Conheço e trabalho com pessoas que se enquadram no altruísmo humilde, como é o caso da Maria Cruz, presidente da Associação de Moradores da Maranduba.
Há pessoas também como a Maria do Carmo do Rio da Prata, Gidalva do Parque Guarani, Jerry do Núcleo Botafogo, seu Cido da Folha Seca, Binato da Sasari, Higino da Barra Seca, Laura do Quilombo da Fazenda, Seu Genésio, Isaias e Moisés da Praia do Camburi, Maria Gabriel da Praia do Pulso etc., que verdadeiramente cumprem sua parte no jogo das relações pessoais e profissionais de forma exemplar. Antecipam problemas, propõem soluções e jogam mesmo o positivo jogo da melhoria do todo. Pessoas que se alegram com uma sinceridade pueril com a vitória dos outros porque conseguem ver nessas vitórias as vitórias do coletivo. Pessoas que não têm medo de desfazer o malfeito, ainda que isso lhes valha antipatias e olhares fulminantes de ódio pela extrema ousadia de deslocar o status quo petrificado, produto de anos de uma política de vaidades e personalismos.
Tenho me assombrado com algumas pessoas que no dia-a-dia das associações buscam só e somente só o seu ganho pessoal. Tanto no aspecto financeiro quanto no aspecto simbólico. Há uma disputa surda de poder que chega, muitas das vezes, a ser irritante e desmotivadora para quem tem por ofício gerenciar os conflitos, por mais zen que se tente ser. Ainda que de forma inconsciente, em nome da vaidade essas pessoas bloqueiam ações, procrastinam projetos e tarefas, sabotam o trabalho alheio. E são pessoas, pasmem, com a dita qualificação acadêmica e até com cursos superiores. Batendo na ponta máxima da escala Richter das vaidades, elas resistem a se mover por acharem, erroneamente, que nada mais têm a aprender, que nem um centímetro a mais podem crescer, seja com os outros, seja com elas próprias. Desdenham das oportunidades de crescimento que lhes aparecem por conta da imexibilidade do seu autoconceito, pronto e finalizado.
Esse lado ruim da vaidade é que corrói e que me enche o saco. O fato do trabalho alheio aparecer e ser valorizado desperta no indivíduo vaidoso uma tremenda vontade de fazer algo que marque uma posição e que lembre ao mundo que ele também existe, não importando para isso quão ridícula seja sua atitude. São puros atos de mesquinharia, de sabotagem, em que são investidas todas as forças do vaidoso. O vaidoso, vejam só, faz uso de toda autoridade possível que esteja a seu alcance para tentar elevar-se à altura daquele que disparou em si seu instinto de vaidade, sua vacuidade, seu orgulho vão.
É bobo ver disputas pequenas de vaidades que sacrificam as relações afetivas, sociais e profissionais. É deprimente saber - porque se acaba sabendo, não se iludam - que a pessoa que elogia seu desempenho profissional na segunda à tarde, na terça de manhã lhe apunhala com a mais maldosa pernada, atingido de morte pela inveja, irmã da vaidade.
Tal qual o pior cego, o pior vaidoso é aquele que não quer ver. O vaidoso cego é tão fortemente movido por recalques inconscientes que apaga as razões que o movem. A razão fica cega, como uma faca que não corta. O buscar do fim - mostrar que ele existe - justifica seus meios, nada éticos, pequenos, minúsculos, ridículos.
Nada mais ridículo, amigo leitor, do que o ser humano querer-se maior do que é. Um juiz que se acha acima da lei, um professor que já sabe tudo, um político que acha que pode com um jeitinho passar por cima das leis etc. Vaidade e falta de semancol são irmãs.
As coisas vão funcionar melhor no dia em que olharmos seriamente (e não retoricamente) para o próprio buraco do umbigo e fizermos algumas perguntas. Será que só faço isso porque ganho algo? Será que só faço isso porque perco algo? Será que só faço isso para ter meus 15 minutos de fama, aqueles mesmos previstos por Andy Warhol? Será que sou vaidoso? Será que sou invejoso? Será que não preciso de dois comprimidos de semancol, de duas em duas horas para ver se fico menos travoso?
A vaidade humana é a ferrugem do elo social. É a areia na engrenagem do coletivo. Sinceramente, nessa semana que passou percebi como somos vulneráveis à vaidade, a sermos vítimas da vaidade, tanto da nossa quanto da dos outros. Perdi um pouco de fé na humanidade, confesso, pelo acúmulo de situações limites recorrentes num curto espaço de tempo. Mas os vaidosos nem se aperceberam.
Provérbio: Zangam-se as comadres, descobrem-se as verdades.


Jairo dos Santos
Vereador - PT

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Mosca-dragão

Pegoava?

Jundu