Crônica

Espécies Exóticas

Ronaldo Dias
Naquele tempo, viviam felizes naquilo que eram. Habitavam um dos lugares mais lindos do planeta. Ali, nada lhes faltava. Água, frutas, de vez em quando uma paca ou um gambá, mandioca, feijão, milho e, muito, muito peixe. Para que mais? Felizes, enquanto os séculos sedimentavam seus costumes, crenças, mitos e, religiosidades. O biótipo era marcado pelos raios do sol e pelas remadas vigorosas na canoa. A população tinha crescimento vegetativo, quase imperceptível, para as inexistentes estatísticas demográficas. Isolados, sem acesso, de difícil contato com o mundo externo, mantinham-se senhores de suas vidas e, de seus desejos. Um modelo de vida de explícita sustentabilidade, ao som afinado dos sabiás, decorado com o colorido alegre dos tiés e das saíras. Do paredão da Espia, vigiavam a aproximação dos cardumes de carapaus e de tainhas. Com esta forma de vida, revidavam, quase comemorando, o esquecimento e, o abandono total de quaisquer governos, ou, de qualquer outra interferência externa, mesmo daquelas transvertidas, como sempre, das “melhores das intenções”. Pela estrada do progresso, vieram inúmeras espécies exóticas e, suas respectivas interferências alteraram, profundamente, aquele balanceado equilíbrio. Unindo-se a caravana dos exóticos, os “bem feitores” da vida alheia, em suas ongs, vieram com a pretensão convicta de ensinar-lhes (imaginem) (ao contrário de aprenderem com eles) como deveriam viver. Daí para chegar onde estamos, foi um pulo. Um “pulico” de nada. Não mais do que duas gerações.
Quando cheguei, procurei adaptar-me ao meio, aos usos e costumes. O tempo, os filhos, depois os netos, incumbiram-se de pintar em toda a minha alma, as tonalidades caiçaras. Algumas espécies exóticas, mesmo com o tempo, não se comportam com o respeito peculiar de quem chega. Não se adaptam ao meio. São insolúveis! São na verdade, simplesmente, espécies invasoras.

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