Confusão bolivariana

Evo Morales sem eufemismos

Por Rui Nogueira
Diante do pandemônio político e informativo criado pelo presidente boliviano, Evo Morales, vale a pena clarear alguns pontos. Botar os pingos nos is em conceitos e fatos que estão ganhando contornos nebulosos com o intuito de dourar a pílula. A saber:

1. Invadiu: Evo Morales não mandou ocupar coisa nenhuma. Tomar um espaço livre é que é ocupar. O governo boliviano mandou o Exército boliviano invadir. A Petrobras e as demais empresas investidoras em petróleo e gás foram in-va-di-das.

2. “Negociação”: O governo Morales não negociou coisa nenhuma com ninguém. Desde o início, o presidente da Bolívia e seus ministros fizeram de conta que estavam querendo renegociar contratos existentes. Nesse faz-de-conta foram ajudados pelo saçarico diletante do presidente Lula e seus ministros, dizendo o tempo todo que as conversas com Morales estavam indo bem, que os “povos irmãos” da Bolívia e do Brasil caminhavam para o entendimento. Morales fazia de conta que negociava enquanto preparava a invasão das refinarias e dos campos de gás e petróleo. Na semana passada, por exemplo, argentinos e bolivianos se reuniram para “renegociar” os preços do contrato que vence no fim deste ano. Alguém fez alguém de bobo!

3. Nacionalização: O decreto de Evo Morales não nacionalizou coisíssima nenhuma. Com Morales ou sem Morales, com Lula ou sem Lula, com Chávez ou sem Chávez, os recursos naturais estavam tão nacionalizados na Bolívia quanto estão no Brasil, Venezuela, Argentina, Chile, França, Alemanha ou EUA. A Constituição desses países diz que os recursos naturais são do Estado, são nacionais. Estão nacionalizados. Dizem as Constituições, também, que o Estado, por meio de concessões legais, autoriza a exploração desses bens. Quando o governo boliviano falava em “nacionalização”, era evidente que estava a desviar o foco da discussão. Nunca foi isso que esteve em discussão.

4. Estatizar e expropriar: Falar em nacionalização era conversa mole. O que o governo Morales fez foi estatizar os campos de petróleo e gás e expropriar os investimentos. O decreto do presidente boliviano não diz nem como nem quando é que o governo dele vai indenizar as empresas pela parte abocanhada. Afinal, como é que a Bolívia vai indenizar uma empresa que responde por cerca de 15% do PIB do país?!

5. Confisco: O governo Morales mentiu ao fazer de conta que estava a renegociar contratos e mentiu ao dizer que a “política de nacionalização” seria tratada em um decreto que, na prática, não faria mais do que regulamentar a nova Lei dos Hidrocarbonetos aprovada ainda no governo de Carlos Mesa, antecessor de Morales. Essa lei, que aumentou o imposto sobre o gás e petróleo de 18% para 50%, teve o apoio do Movimento ao Socialismo (MAS), de Morales. Agora, com o decreto da estatização e expropriação, Morales elevou o imposto de 50% para 82%. Em qualquer lugar do mundo, isso tem nome: con-fis-co.

6. Arranca-rabo: Em qualquer lugar do mundo que se relaciona de maneira minimamente civilizada, uma medida de estatização-expropriação como a que foi adotada pelo governo boliviano de Morales seria precedida de um contato soberano e diplomático para um aviso prévio aos países com quem o país se relaciona economicamente. No caso brasileiro, Morales não só escondeu a medida como fez questão de anunciá-la durante visita a um campo de gás explorado pela Petrobras, em San Alberto, no departamento de Tarija. As relações presidenciais sul-americanas viraram um arranca-rabo que nem diplomático é. A diplomacia presidencial de palanque, praticada por Luiz Inácio Lula da Silva e seus "ministros", corrompeu o que de melhor o Estado brasileiro tem, a tradição profissional no trato das relações externas.

7. Eles sabiam: Lula e Néstor Kirchner foram surpreendidos, mas Hugo Chávez e Fidel Castro sabiam bem o que o companheiro Morales estavam aprontando. Alguém duvida?

8. As “certezas” de Gabrielli: Sem vergonha do ridículo, o presidente da Petrobras, Sérgio Gabrielli, garantiu a Lula que não há risco de desabastecimento do gás boliviano para o Brasil. Por que Gabrielli garante isso? Porque o decreto de estatização dos hidrocarbonetos e de expropriação dos investimentos estrangeiros na Bolívia não prevê a interrupção no fornecimento de gás. Foi a explicação dada no Planalto. Ora, por que o sr. Gabrielli tem tanta certeza disso se a Petrobras tem um contrato com a Bolívia até 2019, que foi simplesmente rasgado por Morales? Mais: a Bolívia pode não interromper o fornecimento, mas a questão é saber a que preço é que esse gás será exportado e chegará às empresas brasileiras. Também não estava previsto em nenhum documento que a Bolívia ocuparia com soldados as instalações da Petrobras, mas ocupou! Mais: o governo Lula mandou dizer, nesta terça, que o sobrepreço mais do que certo não será posto na conta do consumidor. Não?! Então quem vai pagar a conta?! É promessa ao estilo do velho populismo de todas as cores ideológicas, pois em algum lugar a conta do subsídio terá de ser espetada.

9. Líder da desintegração: O Lula líder da integração latino-americana virou piada. Se o presidente brasileiro é hoje líder de alguma coisa, então é líder inconteste da desintegração latina.

10. Piadas inevitáveis: Não resisto em reproduzir as duas piadas postas a circular em Brasília, nesta terça, sobre a relação Lula-Morales-Brasil-Bolívia:
1) é o que dá levar a sério o irmão mais novo que se mete com “drogas”;
2) é o que dá querer diversificar a pauta de exportações; enquanto só exportou coca, a Bolívia nunca faltou nem com o produto nem com os prazos. Em tempos politicamente corretos, faço questão de lembrar: são piadas.

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