Você é de esquerda?

O que significa ser de esquerda? O conceito teve início na França do século 18, quando o rei Luís 16 - aquele mesmo que perderia a cabeça com a Revolução - se viu obrigado pelas circunstâncias a convocar os Estados Gerais, uma espécie de assembléia nacional ampliada. Provavelmente por acaso, os dois primeiros "estados", isto é, a nobreza e o clero, se sentaram à direita da cadeira reservada ao rei. Ao terceiro estado, a burguesia, restou o lado esquerdo. Como nobres e padres defendiam e apoiavam idéias conservadoras, "direita", por metonímia, passou a designar o grupo dos que se opõem a mudanças políticas; "esquerda", por sua vez, passou a indicar os que são favoráveis a alterações.
Diga-se, "en passant", que essa divisão nunca foi muito "justa" com a direita. Afinal, são muito poucos os que olham para o mundo tal como ele é, com todas as suas injustiças e pequenas e grandes perversidades, e concluem que não há nada a melhorar. Além disso, mesmo aqueles empenhados apenas em manter seus privilégios de classe sempre souberam que era preciso muitas vezes ceder. A essência desse pensamento foi captada na tão magistral quanto surrada fórmula de Giuseppe Tomasi di Lampedusa, em "O Leopardo": "Se vogliamo che tutto rimanga come è, bisogna che tutto cambi. Mi sono spiegato?" ("Se queremos que tudo permaneça como está, é preciso que tudo mude. Fiz-me entender?").
No Brasil o pensamento conservador sempre se fez presente. Manter os privilégios é o que importa, ao povo damos promessas e alguns trocados. E muita propaganda. Nada de educação, não é importante. Amanhã vou levar um globo terrestre e papel vegetal para as minhas aulas. Vamos traçar o contorno do Japão e recortar. Depois comparar o tamanho do arquipélago nipônico com o Brasil. Meus alunos vão ter de explicar porque eles não tendo nada, têm tudo e nós, tendo tudo, não temos nada. A diferença ficará clara. Existe um povo educado lá e um povo deseducado aqui. E as perspectivas brasileiras, como é que ficam?
Os programas sociais de Lula poderão até mantê-lo na presidência. Quando digo programas sociais, estou me referindo à distribuição de pequenas quantias aos desprovidos. São bons esses programas, nada tenho contra eles, para quem não tem nada, qualquer ajuda é bem-vinda. Nesse quesito Lula está mudando o comportamento dos governos brasileiros, que culpando um tal de assistencialismo nunca deram nada de substancial ao povo. Ponto para o Presidente, que populista ou não, está atingindo as massas. No entanto, se tais programas resolvem a questão imediata, não projetam o futuro. Entre 1900 e 1980 fomos a oitava nação do mundo em crescimento. De 1980 para cá nos transformamos na octogésima, passamos de oito para oitenta. Enquanto isso duplicou o número de bocas para alimentar. Fica evidente que o assistencialismo do ex-petista Lula poderá pesar na questão eleitoreira, mas nada poderá fazer contra a política neoliberal radical do PT. Estamos quase atingindo o crescimento zero, se continuarmos assim ficaremos como Portugal de Salazar, um país de moeda forte e nada para o povo fazer, exceto partir. O Brasil precisa de um projeto. Isso Lula não tem. Ou melhor, tem, só que de cunho pessoal. Continuar viajando.

Sidney Borges
Inspirado em Hélio Schwartsman

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